Home FilmesCríticas Crítica | A Baleia (2022)

Crítica | A Baleia (2022)

Apelativo ou comovente?

por Felipe Oliveira
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Conhecendo o trabalho de Darren Aronofsky, é sabido que ele não se propõe a ser menos que intenso, incômodo e provocante, o que não deixa de atrair certas polêmicas, e aqui, é um elemento que se evidencia logo no título de A Baleia, seu mais recente filme depois do chocante e bíblico Mãe!. Mas essa é, de fato, a única polêmica que o cineasta se permite cutucar ao dar margem para uma associação pejorativa ao personagem central da história — quando o nome é em alusão a uma redação sobre Moby Dick — já que o mais impressionante é que ele quis retornar com um filme melodramático, sendo esse um fator simples e inofensivo se tratando do turbilhão de sentimentos que gera a quem passeia por sua filmografia.

E essa não é uma característica negativa ao filme, pois é algo que se justifica por seu objetivo: falar sobre a humanidade dos personagens, o que se estende ao cunho de encarar suas nuances, entre acertos e erros. Nessa abordagem, somos convidados a observar esse exercício pela ótica de Charlie (Brendan Fraser), um professor de literatura que sofre de obesidade e vive recluso numa casa. A maneira que somos introduzidos a este universo parte justamente do medo de Charlie de ser visto por outras pessoas — o que entra o artifício da webcam desligada durante uma aula, e outro plano revela a figura por trás da voz da tela escura — e esse é só um dos dilemas do homem devastado, prestes a morrer e que tenta abraçar o mundo com um otimismo além de sua dor, inclinado em curar as mágoas do passado, o que envolve sua ex-esposa e a rebelde filha adolescente Ellie (Sadie Sink).

Ao se concentrar apenas em um cenário, sendo este a residência de Charlie, a proporção da tela em 4:3 foi uma escolha crucial para ilustrar a dificuldade de locomoção do protagonista. Com a chegada de Ellie, é notável os planos que exemplificam isso quando Charlie tenta acompanhar, de costas, olhando por cima dos ombros para a garota ríspida e inquieta, e a câmera captura os movimentos sempre ao redor de Charlie, na limitação de sua visão e postura. Outro ponto é quando a câmera se afasta e apresenta planos mais abertos conforme os personagens se movimentam pelo cômodo e Charlie afundado no sofá, mas tudo dentro da perspectiva do formato da tela, o que denota ainda a condição de confinamento e isolamento.

Fazendo outros paralelos como o da cena inicial, o medo de Charlie de ser visto é abordado também com a ideia da casa — quando ele observa as pessoas irem embora pela sombra que causam ao passarem perto das janelas —  que sendo a ambientação principal, funciona para outras simbologias. E pelo seu confinamento, a casa oferece a única perspectiva que ele consegue ter, seja pelo constante clima chuvoso e nublado ou do pássaro que aparece para se alimentar dos pedaços de frutas deixados num prato. Assim, é como também acontece todo o controle da dramaticidade, o que diz respeito às temáticas e discussões trazidas sobre religião, fé, obesidade, homofobia, luto, suicídio e depressão.

Porém, enquanto a direção  aliado a criativa cinematografia de Matthew Libatique consigam transmitir a sensação sufocante da realidade de Charlie, o roteiro termina sendo um problema, por mais que Aronofsky queira fazer, em sua essência, um filme pungente. Se passar num único cenário reflete muito bem as origens teatrais de Samuel D. Hunter de adaptar a sua peça, e por muito tempo a execução consegue disfarçar o tom teatral que perdura nas linhas de diálogos. Provando que a gama de elogios não foi por hype, Fraser é o coração que pulsa e exprime verdade na sua performance brilhante contra os traços mais apelativos e recorte teatral do texto, aspecto que fica mais evidente com o todo o elenco coadjuvante servindo lágrimas ao fim de cada frase dita.

Se todo o exercício melodramático com o elenco de apoio não tinha sido o suficiente, a cena final grita a intenção de tornar essa história um eco comovente, o que não tira o mérito das discussões trazidas e da abordagem de Aronofsky de falar sobre humanidade através da perspectiva de um homem sufocado por suas mágoas e arrependimentos. E como um exercício recorrente de seus trabalhos, ele encerra The Whale com uma alegoria bíblica de um céu idealizado — sendo simbolicamente o único momento em que o tempo muda e entra luz — abraçando toda busca de Charlie para superar seus conflitos.

A Baleia (The Whale – EUA, 2022)
Direção: Darren Aronofsky
Roteiro: Samuel D. Hunter
Elenco: Brendan Fraser, Sadie Sink, Hong Chau, Ty Simpkins, Samantha Morton, Sathya Sridharan
Duração: 117 min

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