- Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos outros episódios da série, e, aqui, todo o nosso material de Game of Thrones.
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Família ah Família Família ê Família ah Família– Titãs
Apesar de já estarmos acostumados com os saltos temporais neste ponto da série, Driftmark quebra o molde narrativo com uma história sequencial em que acompanhamos o funeral de caixão fechado (he, he) de Laena Velaryon. A morte trágica da personagem serve de base para um episódio com tom melancólico e direção cheia de momentos elegíacos, muitos deles com metáforas sobre o mar (no título, no luto de Laenor, na passagem de Laena, no símbolo da Casa Velaryon e até nos discursos de Rhaenyra no ato final).
Para além desse tom enganosamente calmo das águas, Driftmark é mais um capítulo do seriado que conta sua história em um único ambiente/reunião, dessa vez com ritmo paciente por grande porção da história. É meio engraçado como os personagens não parecem fazer muita coisa entre os grandes períodos de tempo fora de tela, mas as pequenas reuniões criam situações de grande impacto e repercussão narrativa em algumas horas. Cada vez mais e mais a série se aproxima de uma linguagem de soap opera, afinal, quer algo mais familiar do que brigas e rixas ressurgindo nas comemorações ou funerais que unem parentes distantes?
Claro que estou exagerando um pouquinho, e claro que as desavenças são mais brutais no contexto de Westeros, mas é interessante como os roteiristas têm incorporado bem esse lado novelesco com uma fantasia medieval. As elipses e o escopo importam menos do que retratar as dinâmicas familiares destas reuniões sórdidas e contidas. Um dos elementos que mais aprecio nesse sentido são os cenários embaraçosos que o episódio constrói, seja Daemon rindo no funeral; Vaemond fazendo um discurso alfinetando os filhos bastardos de Rhaenyra; Larys estranhamente cobiçando a rainha; e todas as incontáveis meias-verdades e olhares de canto do episódio.
O terço inicial é embebido desses momentos. Alguns encontros constrangedores e outros confrontos velados marcam o início de um funeral de muitas rivalidades familiares, julgamentos e personagens desprezíveis. É realmente um antro de figuras antipáticas e privilegiadas, com um dos melhores roteiros da série em termos de conversações, seja os momentos silenciosos no começo, os segredos entre quatro paredes ou a embalagem teatral após Aemond perder seu olho. Um dos meus momentos favoritos na obra é a conversa entre Corlys e Rhaenys sobre linhagem, legado, nome e poder. É uma troca de diálogos tão bem escrita e encenada, principalmente nas entrelinhas temáticas sobre patriarcado que a série continua discutindo – Corlys prefere perder sua linhagem de sangue do que apostar em duas garotas no trono, por exemplo.
O retrato de depravação da realeza se mantém uma corrente ao longo disso tudo, pontuando a perversão de alguns personagens e a corrupção de outros (principalmente Alicent). Nesse sentido, o romance incestuoso entre Rhaenyra e Daemon é posto novamente em pauta, ainda que a maneira um tanto lírica e melosa que a direção filma os momentos do dois, tanto na caminhada quanto no ato sexual, continua me soando esquisita. E, curiosamente, a nova geração da casa Targaryen ganha bastante espaço narrativo para também demonstrar suas próprias atitudes vis, com um elenco infantil fenomenal e fazendo frente com os atores adultos.
Além disso tudo, é importante notar como Driftmark é um episódio tenso. Seja uma tensão constrangedora no ato inicial, seja uma tensão de momentos específicos (Aemond montando o dragão, a luta dos garotos ou até uma tensão de luto que percorre os personagens), o episódio vai pacientemente se encaminhando para um clímax que é encenado como um grande escândalo, com direito a uma sequência de exagero melodramático quando Alicent ataca Rhaenyra. Também é um ótimo momento para continuar discutindo dramaticamente os contrastes das protagonistas, entre a princesa que explora diversões e libertinagem, e a rainha subserviente.
Aquela montagem ridícula, corrida e atrapalhada do plano de Daemon e Rhaenyra para se casarem e acobertarem a morte de Laenor quase estraga o episódio como um todo, pois chega a ser negativamente notável como os roteiristas não sabem desenvolver tramoias e esquemas políticas. Mas, felizmente, o dissabor do desfecho não apaga um ótimo episódio de casos de família dos Targaryen/Velaryon, seus escândalos, rivalidades e até mesmo brigas infantis. Lutar por um brinquedo nunca foi tão épico, não é mesmo?
A Casa do Dragão – 1X07: Driftmark (House of The Dragon – 1X07: Driftmark) | EUA, 03 de outubro de 2022
Criação: Ryan J. Condal, George R. R. Martin
Direção: Miguel Sapochnik
Roteiro: Sara Hess
Elenco: Paddy Considine, Matt Smith, Emma D’Arcy, Rhys Ifans, Steve Toussaint, Eve Best, Sonoya Mizuno, Fabien Frankel, Olivia Cooke, Graham McTavish, Ryan Corr
Duração: 63 min.