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Crítica | Star Wars: Andor – Episódio 4

Uma riqueza de detalhes sem precedentes na franquia.

por Ritter Fan
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  • spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios.

Apesar de discordar veementemente, eu consigo, com algum esforço, vislumbrar o que alguns afirmam sobre Andor no sentido de a série ser vagarosa. Para mim, porém, existe um abismo de diferença entre ser meramente lenta e ser conscientemente lenta e o quarto episódio da primeira temporada da série salienta maravilhosamente bem a distância entre uma coisa e outra, pois o que Andor não tem de ação típica que, vamos combinar, é ofertada aos borbotões por aí, a série esbanja em uma construção de universo como, arriscaria dizer, nunca antes vi em Star Wars ao ponto de muitas vezes eu me pegar maravilhado com o quanto Tony Gilroy está levando adiante seu conceito de se distanciar do que já conhecemos para ofertar algo realmente diferente, ainda que, claro, com elementos familiares.

Deixe-me usar um exemplo para ilustrar o que quero dizer: em determinado ponto do episódio, depois de levar uma bronca gigantesca pelo fiasco em Ferrix, acompanhamos Syril Karn (Kyle Soller), o Vice-Inspetor da Preox-Morlana, calmamente, com duas valises nas mãos, pegando um transporte, depois um elevador em uma espécie de conjunto habitacional, tocando a campainha de um apartamento e sendo recebido por sua mãe Eedy Karn (Kathryn Hunter) primeiro com um tapa na cara e, depois, um abraço. Nessa prosaica sequência, portanto, não só notamos o cuidado da produção em criar ambientes variados que enriquecem a impressão de espaço vivido e facilitam o mergulho completo na narrativa, como também, sem a necessidade de usar sequer uma linha de diálogo, em criar toda uma história pregressa para Syril.

E o mais fascinante é que a cena que descrevi vem depois que diversas outras situações provavelmente muito mais relevantes para a série foram cuidadosamente detalhadas ao longo do episódio, mostrando o esforço em não deixar nada de lado e de tratar tanto aquilo que tem consequências imediatas, como outras questões que provavelmente só estão ali para dar estofo a personagens e, talvez, justificar ações futuras. Ver Syril Karn ser recebido pela mãe era, para fins do episódio, completamente desnecessário e, qualquer coisa que aprendemos aqui poderíamos aprender com uma linha de diálogo em momento futuro, mas a mágica está justamente no que o roteiro de Dan Gilroy (irmão do showrunner, claro) fez, ou seja, abrir espaço para todo mundo, por mais irrelevante que pareça em uma narrativa fluida, sem forçar nada.

Rebobinando um pouco a análise, mas usando a mesma premissa de detalhamento e realismo que a série vem imprimindo a esse universo, todo aquele conflito entre tenentes do Império sobre quem tem jurisdição sobre o que, com o Major Partagaz (Anton Lesser) tendo que ser chamado novamente para servir de árbitro foi a primeira vez, juntamente com a reunião logo anterior, em que realmente vimos os meandros da burocracia imperial para controlar a galáxia com mão de ferro, com direito a um certo desdém pelo conceito de um esforço organizado de rebeldes. O que quero dizer é que o que poderia ser banal, facilmente apresentado com algumas linhas de diálogo aqui e ali, ganha contornos bem mais ricos e complexos, com literais obstáculos para cada pequeno aspecto narrativo que é trabalhado.

Esse é também o caso da história principal, claro, com Cassian Andor tentando entender primeiro o que Luthen Rael quer com ele e notando que o que ele quer é colocá-lo em uma missão – não é coincidência, óbvio, que a primeira missão do protagonista para os rebeldes é muito semelhante à sua última missão para o mesmo grupo – em que ele simplesmente não é bem-vindo. Sua aceitação poderia ser o fim do drama. Mas não. O roteiro faz questão de lidar com a literal luta de Vel Sartha (Faye Marsay) contra a sugestão de Luthen na superfície do planeta Aldhani e o subsequente descontentamento de quase todo seu grupo em razão da chegada de mais um membro faltando apenas três dias para o grande momento em que eles precisarão roubar dinheiro do Império. Tudo bem que a justificativa de Luthen para sua insistência em colocar Andor no grupo não me pareceu muito sólida, mas isso é algo que dá para relevar pelo momento.

E o que dizer da “transformação” de Luthen Rael de proto-rebelde em um antiquário cheio de afetações que usa seu negócio como fachada para estabelecer seus contatos, especialmente com a Senadora Mon Mothma (Genevieve O’Reilly reprisando seu papel) que, por sua vez, se revela em conflito com o marido, também senador, em razão das alianças dele? Não, o episódio realmente não tem ação alguma, mas, por outro lado, tem tanta informação, tantas situações que, por si só, poderiam sustentar diversos episódios e temporadas, que eu tenho que tirar meu chapéu para o que o roteiro conseguiu fazer e para a direção de Susanna White que trata Andor com um rigor técnico e uma elegância que contribui para aquela impressão de que a série – ainda bem! – muitas vezes nem parece Star Wars.

Novamente Star Wars: Andor acerta em cheio em sua queima lenta, em sua recusa em banalizar a história com incessantes sequências de ação ou o uso barato de efeitos especiais. Aqui, como nos três episódios anteriores, tudo parece autêntico, todas as situações transpiram verossimilhança, nada é fácil ou por acaso ou somente pelo espetáculo. É o lento com significado, com peso, com relevância e não o lento por não ter o que dizer ou que coloca a forma sobre a substância. Ainda há um bom caminho pela frente, claro, mas não tenho nenhum receio de afirmar que estamos diante de um Star Wars finalmente diferente do que nos acostumamos.

Star Wars: Andor – Episódio 4 (EUA, 28 de setembro de 2022)
Desenvolvimento: Tony Gilroy
Direção: Susanna White
Roteiro: Dan Gilroy
Elenco: Diego Luna, Stellan Skarsgård, Genevieve O’Reilly, Denise Gough, Anton Lesser, Kyle Soller, Faye Marsay, Varada Sethu, Alex Lawther, Sule Rimi, Ebon Moss-Bachrach, Gershwyn Eustache Jnr, Sule Rimi, Elizabeth Dulau, Kathryn Hunter, Alastair Mackenzie, Ben Bailey Smith, Varada Sethu
Duração: 49 min.

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