- Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos outros episódios da série, e, aqui, todo o nosso material de Game of Thrones.
Antes de falar do episódio em si, queria passar rapidamente por toda a repercussão online em torno da cena em que é possível ver a luva verde de Viserys, que deveria ter passado por um efeito em pós-produção. Vi algumas pessoas acharem o fim do mundo, também vi sites sensacionalistas dizerem que é um “deslize grave”, e, olha, só tenho uma coisa a pontuar sobre isso: quanto exagero. Confesso que sequer notei o erro quando assisti ao episódio, e, mesmo se tivesse, é algo tão banal, tão sem importância frente a tudo que assistimos de efeitos especiais no episódio, que eu levo a situação na esportiva. Tem muita gente exagerada, e muito portal medíocre que se aproveita deste tipo de “notícia”.
Agora, falando do episódio em si, e já aproveitando a pauta visual, que bacana foi ver um capítulo todo fora do palácio, não? Eu sei que a série tem recebido algumas críticas negativas em torno da fotografia escura e a falta de diversidade em cenários, algo que para mim é uma escolha intencional para o tipo de história em menor escala e mais monárquica que estamos acompanhando, mas a mudança de ares faz bem para os olhos e para a narrativa. As sequências na Floresta do Rei são especialmente bacanas, com muita cor, filtros vivos e ambientes naturais, lembrando muitos momentos da série original, enquanto o conflito com o Engorda-Caranguejos tem um visual mais sujo e envolto por fumaça, me decepcionando um pouco na fotografia de Stepstones que parecia mais bonita no episódio anterior, mas contando com um belíssimo trabalho de maquiagem e, claro, dos efeitos especiais dos dragões.
Antes de falar mais sobre a direção da batalha, quero retroceder um pouco e nos situar do contexto narrativo. Temos o segundo salto temporal do seriado, agora de três anos após Viserys ter anunciado Alicent como sua esposa, e após a aliança entre Daemon e lorde Corlys. Considerando que estamos vendo uma história de dinastia que deve cobrir um longo período da Casa Targaryen no poder, faz sentido que os roteiristas tenham escolhido essa rota narrativa, mas desenhar uma história em constantes saltos temporais (vamos ter mais, podem ter certeza) é algo perigoso, pois o roteiro pode cair demais em contextualizações, ter que preencher os espaços vazios com muitas explicações e, de forma mais objetiva, sofrer para criar arcos e situações que sejam bem construídas, orgânicas e articuladas, e não apenas jogadas sempre que avançamos na cronologia.
Felizmente, O Segundo de Seu Nome lida bem com o salto de três anos. Muitas das situações e dramas são autoexplicativos (Rhaenyra brigada com Alicent; Daemon ainda exilado e mergulhado na batalha em busca de glória; um novo herdeiro que reacende as discussões de sucessão), assim como o roteiro é paciente, foca mais nos personagens do que repetecos, e mantém quase a trama toda durante o festival de caça celebrando Aegon II. Algumas cenas típicas dessas celebrações medievais de cortes me divertiram bastante, como as fofocas e rumores da elite (com destaque para o momento com as velhinhas), a simbologia com animais (Rhaenyra extravasando raiva e Viserys fazendo algo por obrigação) e os barracos da família real.
No entanto, ainda carrego minha principal reclamação do episódio anterior: o lado político pouco elaborado e desenvolvido desde a ótima introdução. Ter dois episódios tematicamente focados em matrimônio não ajuda, dessa vez com Rhaenyra, e é perceptível como um material de origem mais encorpado faz falta. Os diálogos sempre com subtexto, os personagens e olhares dissimulados, as reviravoltas e mistérios bem arranjados, tudo mérito de George R.R. Martin, são substituídos por interações objetivas e indivíduos óbvios, como o Otto que vem se tornando cada vez mais desinteressante para mim, ou então a apresentação de novos personagens como Jason Lannister e Laenor que não parecem trazer algo intrigante para o enredo.
Mas eu não posso reclamar da força motriz do seriado: os dramas familiares. Os roteiristas estão lidando muito bem com o seu lado novelesco, trazendo uma certa intimidade dramática à história, seja a relação de pai e filha entre o Rei e sua herdeira (ou então dela com Cole), seja a ambição e ódio de Daemon. A cena em que o príncipe renegado serve de isca, por exemplo, é simbolicamente significativa para além da ação, uma vez que demonstra um personagem pronto para arriscar e sacrificar tudo para que seu irmão não tenha a glória. É rivalidade fraternal elevada à enésima potência, dispondo de grande atuação de Matt Smith. Enquanto Viserys continua sendo incrivelmente cativante, passando pelo clichê de rei burro, de um monstro quando fez aquilo com sua esposa, até chegar a ser simpático nesse episódio, com Paddy Considine transitando com naturalidade entre suas diferentes características de um monarca egocêntrico, um pai muito humano e um homem sofrendo com as obrigações da coroa.
O Segundo de Seu Nome pode ser lembrado e exaltado por seus efeitos especiais com dragões, imagens violentas, um inimigo visualmente expressivo e suas grandes set-pieces de batalha – um tanto mal dirigidas na minha opinião, com muitos planos contidos que não mostram o campo de batalha. Mas o episódio é melhor para mim mais pelo outro lado narrativo, de dramas familiares em uma falsa celebração, de relacionamentos e conversas íntimas, e de bons conflitos nas cortes, apesar dessa trama de sucessão precisar de mais esquemas, traições e mistérios para oferecer substância política e desdobramentos intrigantes.
A Casa do Dragão – 1X03: O Segundo de Seu Nome (House of The Dragon – 1X03: Second of his Name) | EUA, 04 de setembro de 2022
Criação: Ryan J. Condal, George R. R. Martin
Direção: Greg Yaitanes
Roteiro: Ryan J. Condal
Elenco: Paddy Considine, Matt Smith, Emma D’Arcy, Rhys Ifans, Steve Toussaint, Eve Best, Sonoya Mizuno, Fabien Frankel, Milly Alcock, Emily Carey, Graham McTavish
Duração: 53 min.