- Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios da série.
Entre mortos e feridos, salvaram-se todos. Obi-Wan Kenobi acaba com um episódio que de diversas maneiras espelha O Retorno de Jedi, como mais do que esperado, e encerra uma jornada cambaleante, mas ao mesmo tempo interessante e, para alguns, nostálgica, colocando o velho mestre contra o seu (também agora velho) padawan em um confronto mais definitivo, mais satisfatório do que aquele que vimos na Parte III, o que só reitera minha impressão de que, se era para haver um combate de sabre de luz entre Kenobi e Vader na série, antecedendo o de Uma Nova Esperança, ele deveria ser um só de forma a carregar todo o peso e solenidade que o momento precisava.
Mas mesmo sendo um segundo confronto – o flashback com o padawan de 40 anos na Parte V não conta, claro – em tão pouco tempo, ele funciona melhor, fazendo Obi-Wan Kenobi retornar completamente de seu torpor causado pelo desesperançoso exílio de 10 anos e mostrar todo o seu poder não só ao resistir ao soterramento patrocinado por seu ex-pupilo, como ele mesmo levitando basicamente todas as pedras ao seu redor para arremessar no vilão, com direito a golpes mais violentos de sabre que chegam até mesmo a arrebentar a máscara, expondo seu rosto deformado e fazendo-o respirar e falar com bastante dificuldade. Kenobi, claro, não consegue trazer Anakin do Lado Sombrio com ele, muito ao contrário, dizendo de sua própria maneira aquilo que, alguns anos depois, o Jedi repetiria a Luke, que Darth Vader traíra e matara seu pai.
O planeta genérico em que o embate acontece depois que Kenobi decide abandonar os insurgentes e servir de isca consegue ser mais interessante do que aquela metáfora nada discreta do inferno que foi Mustafar, com a fotografia noturna iluminada quase que exclusivamente pelos brilhos azuis e vermelhos dos respectivos sabre de luz criando o pouco de tensão – mas o muito de catarse para Kenobi – que o embate poderia invocar considerando que o resultado dele não poderia ser diferente. E tudo isso sem que a coreografia precisasse fazer as invencionices dançarinas ou de videogame que povoaram e ajudaram a estragar a Trilogia Prelúdio. Há um bom equilíbrio entre uma luta elegante entre dois homens “engessados” – um pela armadura, outro pela falta de prática – e uma pancadaria raivosa, mas que ao mesmo tempo tenta reverter ao básico da franquia, que a tentativa de se resgatar alguém do Lado Sombrio da Força.
No lado de Reva, sei que muita gente ficará incomodado por tudo o que resultou de Vader atravessá-la com um sabre de luz foi ela mancar um pouco e fazer cara de dor, mas isso já foi muito claramente estabelecido como regra no lado live-action da franquia: só Qui-Gon Jinn e Han Solo é que morrem com uma estocada de sabre de luz (Kenobi foi transpassado e Dooku foi degolado, lembrem-se bem). Darth Maul foi cortado ao meio e caiu em um buraco sem fundo e não morreu, Boba Fett escapou da Sarlacc, Fennec Shand e Cobb Vanth resistem à blasters, o Grande Inquisidor sobreviveu do mesmo destino de Reva e Cad Bane… bem… esse aí até pode ter morrido, mas eu duvido muito, até porque já vi gente defendendo o retorno até de Mace Windu, mesmo depois de ele ser literalmente defenestrado da franquia. Portanto, vamos combinar que não é preciso muito mais suspensão da descrença para aceitar que Reva está vivinha da silva e que um Band-Aid resolve o problema dela.
Dito isso, apesar de o roteiro também tentar criar tensão com algo que sabemos que não acontecerá, seu arco de redenção vem espelhar o de Darth Vader em O Retorno de Jedi, algo já esperado e que também funciona bem aqui, muito melhor do que se Kenobi chegasse a tempo de salvar o pequeno Luke, com direito a discursos motivacionais. Reva se vê no futuro Jedi ali desmaiado à sua frente e, sozinha, lida com seus fantasmas e reverte ao que era antes de ser sistematicamente corrompida pelo Império. Confesso que eu gostaria que isso tivesse acontecido de forma mais orgânica dentro da trama principal, sem criar esse “apêndice” em Tatooine, mas creio que era inevitável que tudo acabasse onde começou, o que nos permite também ver breves momentos de conexão de Kenobi com Owen Lars (aliás, Owen e Beru mandam bem, hein?) e com o próprio Luke.
E o prêmio para os fãs – eu me excluo dessa, pois acho o personagem intragável – e também para Kenobi é o fantasma de Qui-Gon finalmente aparecendo para guiar seu pupilo pelos anos que tem à frente e fazer a ponte com o que ele mesmo se torna depois que Vader finalmente o mata, mas só porque ele deixa, claro. A ponta não creditada de Liam Neeson é o final perfeito para uma minissérie bastante imperfeita que gostaria que permanecesse como minissérie e não continuasse com mais um caso que retire Kenobi de sua reclusão agora no desfiladeiro onde morará depois de finalmente abandonar sua “Caverna de Platão” e passar a enxergar o mundo como ele efetivamente é, algo que Vader só faz nos braços de seu filho já crescido, na segunda Estrela da Morte. Se é para “continuar” algo, talvez uma série focada em Vader que sirva para introduzir a Doutora Aphra e seus dois magníficos dróides assassinos seja mais interessante.
Entre um belo trabalho de maquiagem e de voz quando Vader está com seu capacete destruído, a breve aparição de Ian McDiarmid em holograma, o fofo adeus à Leia em Alderaan que ecoa basicamente por toda a franquia em poucas linhas de diálogo, Kenobi voltando a ser o guerreiro que era depois de uma década escondido e com medo, além do uso das trilhas clássicas de John Williams, notadamente o tema de Leia e a Marcha Imperial, a série chega a seu fim de maneira sóbria, capaz até de elevar a impressão de conjunto sobre ela. Kenobi pode, agora, meditar e comungar com a Força e com seu velho mestre no tempo que lhe resta até seu sacrifício final por um bem maior, já como Alec Guiness.
Obi-Wan Kenobi – Parte VI (EUA, 22 de junho de 2022)
Direção: Deborah Chow
Roteiro: Joby Harold, Andrew Stanton, Hossein Amini (baseado em história de Stuart Beattie, Joby Harold, Andrew Stanton)
Elenco: Ewan McGregor, Vivien Lyra Blair, Moses Ingram, Hayden Christensen, James Earl Jones, Rupert Friend, O’Shea Jackson Jr., Maya Erskine, Kumail Nanjiani, Joel Edgerton, Bonnie Piesse, Simone Kessell, Jimmy Smits, Ian McDiarmid, Liam Neeson
Duração: 50 min.