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Crítica | O Morcego Vermelho: Origem e Primeiras Aventuras

Um herói criado por brasileiros!

por Luiz Santiago
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Criado pelos artistas brasileiros Ivan Saidenberg e Carlos Edgard Herrero, o Morcego Vermelho é uma mistura de Batman com (possivelmente) elementos de outros heróis da Disney que já existiam quando esse atrapalhado mascarado apareceu nas páginas dos quadrinhos, em 1971: O Superpateta e o Superpato. Neste compilado eu trago críticas para todas as histórias da primeiríssima revista onde o Morcego Vermelho apareceu: a Edição Extra 53, da Editora Abril, um especial cheio de aventuras que, de uma vez só, estabeleceu o caráter do personagem, seu modo de atuação e seus primeiros passos no mundo do heroísmo — isso e a ligação com o Peninha, que é a pessoa por trás do manto/fantasia de Carnaval abandonada do Donald, desse novo salvador de Patópolis. Você já leu essas histórias? Conhece o Morcego Vermelho? O que acha do personagem? Confira as críticas abaixo e deixe sua opinião nos comentários ao final da página!

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Quem é o Morcego Vermelho? / Tudo Começou Assim…

Quem diria… um satírico herói dos quadrinhos da Disney criado por brasileiros, mas cujo manto não é vestido por um personagem brasileiro da Disney, como o Zé Carioca (se bem que o Zé também ganharia um manto heroico, sendo diretamente inspirado nesse aqui — mas deixemos este assunto para uma outra crítica)! O escritor Ivan Saidenberg e o desenhista Carlos Edgard Herrero talvez estejam surfando na onda do Superpateta (criado em 1965) ou talvez de um super-herói do mundo dos patos que teve a sua estreia no ano de 1969, na revista Topolino, o temível Superpato. A relação entre os dois heróis é muito grande, mas a proposta dos artistas brasileiros, ao criarem o Morcego Vermelho, é diferente daquela dos artistas italianos ao apresentarem o Superpato em O Diabólico Vingador. O tom de deboche e “zuera” típicos de nossa cultura podem ser vistos na construção desse herói atrapalhado e totalmente “não-heroico”, postura bastante coerente com a personalidade do Peninha, que é a face civil do Morcego.

A introdução ao mascarado acontece em uma história de uma página intitulada Quem é o Morcego Vermelho?, que mostra os Irmãos Metralha fugindo apavorados dessa figura medonha e, após uma gag típica das histórias com o Peninha, temos uma quebra de quarta parede e uma introdução verdadeira ao indivíduo, na história longa Tudo Começou Assim… De volta da Patagônia, Tio Patinhas chega à redação da Patada e encontra seus sobrinhos dormindo na mesa, o que gera a esperada demissão da semana. Temos aqui o problema que se desenrolará em algumas camadas e acabará por levar Donald e seu primo para uma festa à fantasia. E aqui o roteiro de Ivan Saidenberg não enrola e nem faz mistério desnecessário em relação à origem do herói: ele surge completamente por acaso e é da maneira mais deliciosamente caótica possível.

Uma das grandes diferenças entre o Morcego Vermelho e o Superpato está na seriedade com que os criadores desses personagens os tratam. Guido Martina e Giovan Battista Carpi tinham um foco, inclusive editorial: mostrar para as pessoas que reclamavam que Donald era um perdedor nato e que não conseguia se sobressair em nada em sua vida, estavam considerando apenas um lado do personagem. Dessa forma, o Superpato, por mais atrapalhado, cômico e bobo que seja em alguns momentos, é um personagem que se leva a sério e os escritores de suas histórias não abandonam esse lado, pelo menos em algum aspecto das histórias. No caso do Morcego Vermelho, a situação é diferente em proposta editorial, roteiro e arte.

A intenção com esse mascarado  é o puro escracho, no melhor sentido do termo: um personagem criado para ser inteiramente atrapalhado, mas ainda assim combater o crime. E diferente do Superpato, ele surge como alguém adorado pelo povo, graças à campanha de marketing feita pela Patada, em uma reportagem que Donald escreve sobre o herói, elevando exageradamente as qualidades do mascarado e fazendo com que a população de Patópolis caia de amores por ele. Inclusive, temos um quadro do Peninha celebrando a quantidade enorme de cartas, os inventos que o Professor Pardal disponibiliza para ele e o fã clube que os Escoteiros Mirins fundaram para o Morcego Vermelho! Um início completamente maluco e muito bem recebido pelo público. Muito mais sortudo, informal, despreocupado e midiaticamente louvado que o Superpato. Vejam só como são as coisas.

Quem É O Morcego Vermelho? / Tudo Começou Assim… — Brasil, maio de 1973
Código da História: B 72041P / B 72081
Publicação original: Edição Extra 53
Editoras originais: Editora Abril
Outras publicações: Disney Big 22, Peninha 50 Anos 1
Roteiro: Ivan Saidenberg
Arte: Carlos Edgard Herrero
Capa: ?
1 página (primeira história) e 15 páginas (segunda história)

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A Lata de Lixo Morcego / A Confederação dos Fora da Lei

Aqui, mais uma vez, começamos com uma história de uma página (A Lata de Lixo Morcego), onde onde Morcego Vermelho fala com o público, dizendo que este é o seu lugar de observação diária e também o lugar onde ele guarda o seu uniforme. É uma daquelas páginas de piada rápida, com situações absurdas que nos fazem rir justamente pelo caráter de maluquice que elenca. O bom é que Ivan Saidenberg consegue fazer valer o riso ao mesmo tempo que nos conta mais alguma coisa sobre o Morcego Vermelho, que desta vez precisa enfrentar A Confederação dos Fora da Lei, grupo de bandidos formado na prisão com o objetivo de se vingar do mascarado. O texto também faz uma narrativa de continuidade, colocando os Irmãos Metralha enjaulados por causa do Morcego, uma referência direta aos eventos de Tudo Começou Assim…

O Mancha Negra também faz parte da aventura, e é dele que vem as maiores novidades, em termos de movimentação dos personagens. Como sempre, estamos diante de fugas misteriosas, deixando o Coronel Cintra em estado de atenção e cobrando uma ação mais direta do herói. A relação dele com Donald é bem parecida com o que vimos apresentada na primeira história. Donald sabe quem é o Morcego Vermelho, porque “o manto” do herói é uma simples fantasia que estava jogada o porão do famoso pato, utilizada para uma festa que ambos resolveram visitar, a fim de fazerem uma boa reportagem para A Patada. No presente enredo, o jornal ainda tem um papel importante para o herói, pois segue vendendo notícias a rodo sobre ele, e Patinhas continua muito animado, aumentando o salário de Donald e Peninha em mais dez centavos. É ou não é um “excelente patrão”, esse muquirana?

E desta vez temos o contato do Morcego Vermelho com o Professor Pardal. Isso tinha sido apenas citado na aventura anterior, mas aqui vemos de fato uma cena entre os dois, e o padrão é o mesmo que conhecemos das histórias do Superpato, com o inventor fornecendo todo o tipo de materiais tecnológicos para que a vida heroica possa seguir em frente. Mas, como estamos falando do Morcego Vermelho, é claro que as coisas são bem mais caóticas também nessa seara. A cena do pula-pula que substituiu a moto me fez rir com gosto, e eu sigo adorando a maneira como o autor coloca os bandidos no caminho do mascarado e cria alguma tragédia que irá barrar esses bandidos, mesmo que eles levem a melhor num primeiro momento. Um senso de suspense pode ser observado no decorrer de toda a ventura, atmosfera que, juntamente com a comédia, cria algo prazeroso de se acompanhar.

A Lata de Lixo Morcego / A Confederação dos Fora da Lei — Brasil, maio de 1973
Código da História: B 72045P / B 72087
Publicação original: Edição Extra 53
Editoras originais: Editora Abril
Outras publicações: Disney Big 22
Roteiro: Ivan Saidenberg
Arte: Carlos Edgard Herrero
Capa: ?
1 página (primeira história) e 11 páginas (segunda história)

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O Pula-Pula Morcego / Os Robôs-Roubões

O meio de transporte que me arrancou ótimas risadas na aventura anterior volta aqui em O Pula-Pula Morcego, história de uma página que introduz o leitor a uma das muitas criações e melhorias que o Pardal fez para o Morcego Vermelho. Nessa história, os autores abraçam a “vertente Batman” dos enredos desse herói brazuca, já que esse enredo serve para mostrar um bom número de apetrechos criados por Pardal para o herói combater o crime (e melhor ainda: sem cobrar um tostão!). Já Os Robôs-Roubões dá sequência imediata à história do pula-pula, e traz uma ótima interação do Professor Gavião com mascarado, com quem chega ir para outro planeta (ou seria um asteroide?) passando lá algumas semanas, período no qual eles têm contato com os estranhos Asterísticos e seus inimigos, os Astéricos, nativos do lugar. Embora não tenha nenhuma relação direta, essa história toda me lembrou bastante uma cômica aventura literária de ficção científica chamada Professor Shonku: O Diário do Viajante Espacial, de 1961.

Todos os blocos de ação dessa história são interessantes. O primeiro, com a criação das máquinas e objetos para o Morcego Vermelho, traz um ar de novidade que imediatamente nos leva para o segundo bloco, com o Gavião. E essa alternância de saída de um bloco narrativo e imediata entrada em outro torna a aventura gostosa de ler, com uma surpresa nos aguardando a cada nova página. Quando percebi que herói e vilão estavam saindo da Terra em um foguete, acreditei que a qualidade da trama iria ladeira abaixo, mas estava enganado. A parte com os alienígenas é muito divertida e está colocada de maneira bem fluída aqui, tanto na maneira de se apresentar, como no corte que traz Morcego e Gavião de volta à Terra, revelando-nos, ao cabo, que o pobre do Peninha foi despedido pelo Tio Patinhas, por passar semanas sem ir ao trabalho. Será que se o Peninha escrevesse uma reportagem sobre o que aconteceu, o tio-patrão iria acreditar?

O Pula-Pula Morcego / Os Robôs-Roubões — Brasil, maio de 1973
Código da História: B 72046P / B 72089
Publicação original: Edição Extra 53
Editoras originais: Editora Abril
Outras publicações: Disney Jumbo 5
Roteiro: Ivan Saidenberg
Arte: Carlos Edgard Herrero
Capa: ?
1 página (primeira história) e 21 páginas (segunda história)

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A Serviço do Mal

Eu já estava esperando quando outros personagens do mundo dos patos apareceriam como coadjuvantes nas histórias do Morcego Vermelho, e a resposta veio ainda nessa primeiríssima leva de aventuras do herói, com a Maga Patalójika tentando (de novo e mais uma vez) roubar a moedinha número um do Tio Patinhas. O roteiro de Ivan Saidenberg continua fazendo muito bem o trabalho de desenvolver blocos distintos dentro de uma mesma aventura, com todos eles funcionando de maneira cômica, bem encadeada e, mais importante, mantendo a unidade de toda a proposta da história. A ideia desse enredo é mostrar o Morcego Vermelho agindo como se fosse um vilão, sob os comando hipnóticos da Maga, o que não parece nada difícil de se conseguir, porque o Peninha já é um personagem completamente no mundo da Lua; para ele conseguir ser hipnotizado é coisa de um estalar de dedos.

As gags são bem divertidas nessa aventura, com a arte de Carlos Edgard Herrero usando e abusando da cara enfeitiçada do Morcego para deixar muitas sequências ainda mais engraçadas. A luta interior do personagem chega ao seu ponto máximo quando encontra a Vovó Donalda, isso depois de mostrar que realmente pode ser alguém desagradável “e cometer alguns crimes terríveis” (outro dos meus momentos favoritos de toda a aventura). Numa discussão mais aprimorada, podemos usar a história como meio de discussão para o “cancelamento” de pessoas públicas pela massa que antes os idolatrava. Igualmente comparável a coisas que temos em nossos dias é o papel da imprensa e da “opinião de especialistas” na tentativa de salvamento da pessoa cancelada. No presente caso, é um meio positivo, justo e necessário de uso, já que o Morcego era inocente e merecia toda essa atenção e defesa. Mas é possível pensar como essas mesmas forças midiáticas (de parte da imprensa e das redes sociais) são utilizadas cotidianamente para vender mantos de bom-mocismo para um grande número de bandidos pelo Brasil e mundo a fora.

A Serviço do Mal — Brasil, maio de 1973
Código da História: B 72099
Publicação original: Edição Extra 53
Editoras originais: Editora Abril
Outras publicações: Disney Jumbo 5
Roteiro: Ivan Saidenberg
Arte: Carlos Edgard Herrero
Capa: ?
15 páginas

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A Moto-Morcego / O Marajá de Shingatudo

O Mancha Negra está de volta! Depois de nos apresentar mais uma piadinha de uma página — desta vez, sem ligação direta com a aventura seguinte — o autor nos mostra um momento difícil na vida do mascarado, quando ele tenta de tudo, mas não consegue colocar as mãos no bandido. É um daqueles roteiros que mostram o vilão agindo de forma inteligente, enganando o mocinho das formas mais “vergonhosas” e ao mesmo tempo divertidas possíveis. Mas o mais legal é que o texto segue para um caminho crítico do status quo, fazendo-nos pensar como certos estamentos sociais dão muitíssimo valor para títulos, aparência de muito dinheiro, comportamento aparentemente “civilizado” e bom papo de alguém que se mostra como importante na sociedade. A quantidade assustadora de golpistas que temos em atividades de sucesso hoje em dia, em diversos lugares do mundo, é uma prova disso.

Tio Patinhas fica tão impressionado com esse tal marajá, que o leva para o clube dos milionários, a fim de fazer uma pequena adulação. Não é solicitada nenhuma prova de quem realmente é essa pessoa ou nada que possa definir melhor a origem do novo ricaço que está a passeio na cidade. Mas não demora muito tempo para a verdade vir à tona. O lado jornalístico de Donald e Peninha é posto à prova aqui, com um pouco menos de charme que nas outras aventuras, mas ainda assim, de forma boa e interessante. O final tem aquele sabor de história cíclica, que apresenta uma situação engraçada e marcante no começo e consegue fazer com que o final revisite esse lugar, trocando os papéis dos personagens. Mais uma boa aventura deste primeiro volume de histórias do Morcego Vermelho.

A Moto-Morcego / O Marajá de Shingatudo — Brasil, maio de 1973
Código da História: B 72042P / B EE   53-J
Publicação original: Edição Extra 53
Editoras originais: Editora Abril
Outras publicações: Disney Big 22
Roteiro: Ivan Saidenberg
Arte: Carlos Edgard Herrero
Capa: ?
1 página (primeira história) e 11 páginas (segunda história)

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Utilidades Morcego / Morcego Vermelho Conquista a Glória

Fechando o especial Edição Extra 53, esta história faz uma grande brincadeira com a identidade do Morcego Vermelho, uma questão que já vinha sendo citada anteriormente. Patacôncio quer porque quer descobrir a identidade secreta do Morcego, pois dessa forma, ele terá o perfeito furo jornalístico para o seu jornal, batendo A Patada, que vem lucrando rios de dinheiro desde que o Morcego apareceu. O que dá o gás necessário para esta aventura é justamente a “comédia dos erros” que Saidenberg utiliza em seu texto, brincando com as muitas possibilidades de identidade do herói e utilizando-a para responder algumas perguntas levantadas antes, para colocar um ponto final ou algumas interrogações em dilemas já expostos antes (como a própria identidade do protagonista, por exemplo) e fechar esse primeiro momento de Peninha com Glória, a garota de quem ele gosta e que acabou se apaixonado pelo Morcego Vermelho.

Quando a “grande revelação” é feita, ao final, o leitor se sente um bobo por não ter percebido desde o início qual era a resposta. Bons roteiros com algum mistério em cena conseguem fazer isso com a gente. A verdade é literalmente colocada em uma parte do texto, a narrativa se desenvolve inteira em cima disso e a gente não consegue “dar o nome aos bois“, quando na verdade esse nome já tinha sido dado e a nossa atenção foi espertamente desviada pelo autor,  num excelente uso do recurso de McGuffin. Um fechamento muito divertido para essa revista de apresentação do Morcego Vermelho, que visita temas abordados em outras aventuras e consegue se despedir com um gostinho de quero mais. Baita trabalho da dupla dinâmica Saidenberg e Herrero!

Utilidades Morcego / Morcego Vermelho Conquista A Glória — Brasil, maio de 1973
Código da História: B 72044P / B 73001
Publicação original: Edição Extra 53
Editoras originais: Editora Abril
Outras publicações: Disney Big 22, Disney Especial (1ª Série) 107
Roteiro: Ivan Saidenberg
Arte: Carlos Edgard Herrero
Capa: ?
1 página (primeira história) e 12 páginas (segunda história)

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