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Crítica | Star Trek: Discovery – 4X11: Rosetta

Contexto é tudo.

por Ritter Fan
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  • Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios da série e, aqui, de todo nosso material sobre Star Trek.

Em uma análise corrida, seria muito fácil concluir que Rosetta é mais um filler dessa segunda parte da quarta temporada de Discovery, especialmente considerando o caráter “enrolador” que os episódios mais recentes tem adotado, de forma a atrasar a introdução da misteriosa Espécie 10-C. Não que fillers sejam ruins por natureza, porque não são, mas seria justo, diante do que não vem ocorrendo, rolar os olhos para a missão exploratória liderada pela capitã xenoantropológa Michael Burnham pela superfície de um planeta imediatamente além do hipercampo que parece proteger os alienígenas extragalácticos, com o objetivo de obter contexto cultural sobre eles e, com isso, facilitar o primeiro contato, tudo faltando meras 29 horas para que a Terra e Ni’Var comecem a ser destruídos pela ativação da anomalia lá por perto.

Mas a grande verdade é que essa missão, muito diferente de constituir apenas mais um “intervalo” para a revelação, era essencial para que ela não fosse simplesmente banalizada, como acontece na maioria das vezes na franquia quando uma nova espécie é introduzida. Afinal, quantas vezes já vimos um representante de uma nova espécie aparecer na tela da ponte para “bater um papo” ou os mais diversos capitães e seus subordinados basicamente tropearem neles em planetas tanto amigável quanto hostis? Portanto, assim como Michael procurava contexto cultural para a espécie misteriosa, a série também precisava nos oferecer algo mais do que o “toma aqui os fulanos”.

E é para isso que Rosetta serve e é isso que, estritamente falando, o episódio faz muito bem. Concordo que as deduções sobre tudo o que eles veem – ou acham que veem – na superfície do planeta desolado parecem acontecer instantaneamente, como se todos ali fossem descendentes diretos de Sherlock Holmes (e o equivalente ao detetive literário lá de Kaminar, claro), mas isso é tão comum na franquia e, francamente, em qualquer obra com a mesma estrutura narrativa, que não acho razoável considerar isso como obstáculo intransponível para se apreciar a forma cadenciada como o episódio lida com as descobertas, desde a forma dinossáurica (???) dos alienígenas, passando pelo quanto eles ali são afetados pelo equivalente de feromônios em duas “versões” distintas, uma em desespero absoluto pela aproximação da destruição e da morte e outra em amor absoluto dentro do berçário. Pode até ser brega uma abordagem do tipo “o poder do amor”, e isso pode levar a uma resolução talvez fácil demais do conflito, mas pelo menos aqui eu interpreto como uma manifestação da visão eminentemente positiva e pacifista de Star Trek.

O retorno do medo em Saru, o primeiro vislumbre de aspectos pessoais de Detmer e uma calma inesperada e ao mesmo tempo tão procurada por Culber emprestam camadas pessoais à experiência de se conectar com o que resta, ali, de uma espécie que teve que abandonar seu planeta natal e esconder-se atrás de um escudo intransponível que talvez a tenha tornado insensível para os danos que ela causa universo afora. Será muito interessante ver – e, se os showrunners tiverem coragem, também destruidor – como é que a 10-C ganhará vida diante de nossos olhos, se como algo profundamente insensível mesmo e, portanto, novos e mortais inimigos para a Federação (pessoalmente, meu caminho preferido no momento) ou se algo que tem salvação no momento em que a “Pedra de Rosetta” for utilizada.

O que eu não quero ver – e aí estou entrando no campo da especulação, eu sei – é uma Espécie 10-C que seja algo como uma inteligência artificial que congrega as mentes da espécie extinta ou que nosso querido David Cronenberg reapareça depois de sua missão misterioso para salvar o dia no último segundo.  Mas, vamos dar tempo ao tempo, já que só faltam dois episódios para a temporada a acabar e absolutamente todas as cartas ainda estão na mesa, sem nenhum tipo de descarte relevante, nem mesmo o uso da “solução final” por parte de Tarka.

Os leitores mais atentos repararão, porém, que, quando eu mencionei que o episódio lida muito bem com expedição no planeta para desencavar contexto cultural, eu tive o cuidado de usar a expressão “estritamente”. E meu ponto é que tudo aquilo que está ao redor do coração do episódio me pareceu perdido na narrativa. A trama paralela envolvendo Book e Tarka infiltrando-se na Discovery para instalar o “xptz” capaz de “xwyz” a nave foi cansativa, especialmente quando notamos que o reaparecimento de Jett Reno (ela estava em criogenia, meditando, presa no banheiro, de castigo, repintando o casco da Discovery? Vocês decidem…) serviu única e exclusivamente para ela ser “sequestrada” por Tarka e levada à nave de Book para criar aquele cliffhanger bobalhão. Eu adoro quando a série trabalha seus coadjuvantes como Detmer, mas é patético ver como outros só existem quando têm função específica a ser cumprida.

Aliás, já que estou falando nisso, confesso que o mesmo raciocínio vale para Adira Tal. Sua introdução foi cheia de pompa e circunstância, e a personagem protagonizou um dos melhores episódios de toda a série (falo de Forget Me Not), mas, agora, houve sua transformação em coadjuvante que não tem mais o que fazer. Adira, agora, é tão importante quanto o lagarto zoiudo trapalhão que volta e meia vemos na série, com a desvantagem de o lagarto sem consideravelmente mais engraçado. Sua tentativa de “fazer amizade” com Detmer me parece uma abordagem absolutamente canhestra e preguiçosa para a personagem, além de ser completamente deslocada no episódio.

Rosetta, no final das contas, mesmo metendo os pés pelas mãos em tudo o que não se refere à missão principal, pelo menos parece fazer a temporada voltar aos trilhos, com um bom preparo para o que está por vir e já deixando o tabuleiro pronto para a introdução da Espécie 10-C no próximo capítulo (dedução que faço a partir de seu título, justamente Species Ten-C) e um final de quarto ano que consiga – com sorte – compensar a enorme barriga enroladora que tivemos desde seu retorno do hiato até The Galactic Barrier.

Star Trek: Discovery – 4X11: Rosetta (EUA, 03 de março de 2022)
Showrunners: Alex Kurtzman, Michelle Paradise
Direção: Jeff Byrd, Jen McGowan
Roteiro: Terri Hughes Burton
Elenco: Sonequa Martin-Green, Doug Jones, Anthony Rapp, Wilson Cruz, David Ajala, Ian Alexander, Emily Coutts, Oyin Oladejo, Patrick Kwok-Choon, Chelah Horsdal, Oded Fehr, Ronnie Rowe Jr., Ayesha Mansur Gonsalves, Annabelle Wallis, David Cronenberg, Shawn Doyle, Rachael Ancheril, Tara Rosling
Duração: 49 min.

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