Após produzirem o premiado e impactante Free Solo, a dupla de diretores Jimmy Chin e Elizabeth Chai Vasarhelyi retorna com mais um documentário que encontra no esporte de risco um de seus pilares. Se na obra de 2018 a base era a escalada sem proteção, em The Rescue somos apresentados ao perigoso mergulho em cavernas. Aqui, no entanto, a atividade recebe uma importância ainda maior dentro da narrativa, uma vez que os mergulhadores são convocados para um resgate improvável.
Qualquer pessoa com acesso à mídia certamente ouviu falar sobre o time de futebol juvenil que ficou preso em uma caverna subaquática na Tailândia em 2018, algo que comoveu o mundo todo e moveu esforços de diferentes países. Conforme o tempo passava, a situação se tornava mais dramática, visto que o local poderia inundar completamente, ao mesmo tempo que os prisioneiros estavam sem alimento ou cuidados médicos. Graças à coragem, habilidade e resiliência de todos os envolvidos, inclusive dos garotos, a operação deu certo. Essa é a história de The Rescue.
Trago na sinopse o início, meio e fim dessa história justamente porque temia que a experiência fosse prejudicada por conhecer os fatos antes de assistir. É sempre arriscado para documentaristas lançar trabalhos pouco tempo depois do assunto abordado, podendo resultar em uma obra previsível. Porém, a obra foge disso devido a riqueza de imagens e ao focar principalmente no grupo de mergulhadores, trazendo um olhar para o longa.
Sobre a parte visual, o surgimento de câmeras cada vez menores e fáceis de manusear definitivamente revolucionou os documentários, especialmente os que envolvem atividades de risco, algo que está se tornando especialidade de Jimmy Chin e Elizabeth Chai Vasarhelyi. Em The Rescue, vemos detalhadamente e em planos subjetivos a escuridão da caverna, a força das águas e a sujeira do local, ressaltando a imensa dificuldade de realizar o resgate. Além disso, acompanhamos em detalhes o quão complexo foi o mergulho e complicado transportar os garotos por um trajeto tão desafiador. Para qualquer gênero cinematográfico, mais impactante do que citar algo, é mostrar. Nessas horas, vale a pena abrir mão do recurso da entrevista para exibir as ações, ainda que com algumas imagens tremidas. Com isso, os diretores alcançam o grande ponto dramático da obra, ressaltar a coragem e imensa habilidade dos mergulhadores pelas próprias lentes deles.
Outra tarefa complicada dos documentaristas foi construir a narrativa sem a fala dos garotos, que não puderam ser entrevistados por terem vendido os direitos de suas histórias para outra produtora. Por isso, os realizadores acertaram ao focar no time de mergulhadores, não só durante o resgate, mas apresentando o que os levou a adotar um esporte tão perigoso como divertimento. Assim, somos apresentados a um mundo de timidez, introspecção e insegurança. Surpreendentemente, o medo do dia a dia os levou a um hobby perigoso, mas que, para eles, representa um momento de silêncio e paz, sendo um dos poucos momentos da vida de cada um com sensação de que estavam no controle.
No entanto, a beleza dessa alegoria, que se relaciona com o drama dos meninos, visto que foram para a caverna para brincar e fugir do mundo exterior, perde um pouco de força no exagero de informações do documentário. Preocupados em dar um panorama geral do fato, os diretores deixaram de se aprofundar nos protagonistas que a obra apresenta: os mergulhadores. Não há necessidade, por exemplo, de pontuar a presença de um líder religioso tailandês no local, quando ele pouco acrescenta ao arco principal. Aliás, essa tentativas de inserir personagens tailandeses no documentário, ainda que válidas para evitar uma visão apenas ocidental do evento, soam vazias e meramente obrigatórias. As relações entre o acidente com um conto local são outro exemplo disso. Se o objetivo era abordar a cultura tailandesa, algo que sem dúvida merece atenção, que fosse feito com cuidado e interesse.
São elementos que impedem o documentário de se tornar uma obra-prima do gênero, mas a obra certamente é composta na maior parte do tempo por momentos interessantes. Cativa acompanhar pessoas subestimadas pela sociedade terem papel fundamental no resgate de garotos. Mesmo diante de ofensas, eles não se rebelaram contra o mundo ou atacaram a si mesmos, mas encontraram uma forma de lidar com isso, através de um esporte inusitado para alguns e libertador para outros. Mais do que um heroísmo exagerado, The Rescue ressalta a importância de resistir, seja a um acidente improvável ou a uma infância traumática. Sempre chega o dia de mostrar o próprio valor.
The Rescue (Idem) – EUA e Reino Unido, 2021
Direção: Jimmy Chin e Elizabeth Chai Vasarhelyi
Roteiro: Wes Tooke
Elenco: Jim Warny, Thanet Natisri, John Volanthen, Derek Anderson, Rick Stanton, Mikko Paasi, Richard Harris, Josh Morris, Mitch Torrel, Craig Challen, Ruengrit Changkwanyuen, Josh Bratchley, Jason Mallinson, Connor Roe, Fiona Harris, Ben Svasti Thomson, Chris Jewell, Felix Rosen, Saman Gunan, Vern Unsworth
Duração: 107 min