Mesmo que tenha ajustado alguns pontos dramaticamente necessários em sua nova empreitada de episódios, Emily em Paris brilhou com mais intensidade em sua primeira temporada, o que por sua vez, não depõe contra o segundo ano desta série sobre relacionamentos amorosos, fraternais e profissionais, moda e imagem, choques culturais e tantos outros temas que seriam ainda mais interessantes se o escapismo estivesse associado ao senso mais crítico que se espera em nossa atual era de tantas demandas sociais na cultura do entretenimento. O leitor pode se questionar os motivos das minhas indagações diante da importância de propostas apenas para diletantismo. Explico: Emily, interpretada de maneira carismática e atraente por Lily Collins é uma jovem mulher que habita um mundo de constantes transformações, em diálogo constante com homens gays, situações tóxicas em contato com os seus pares no ambiente de trabalho, além de tantas outras circunstâncias de uma garota bem-sucedida no mundo dos negócios. Só diante deste cenário, espera-se o estabelecimento de passagens mais substanciais em sua jornada, o que não acontece. Deixa a série menos interessante? Sim, mas não impede que a tenhamos como uma opção de consumo mais ligeira. Outro ponto: até mesmo em sua abordagem escapista, os novos episódios não envolvem tanto como o ano anterior.
Diante do exposto, vamos trabalhar em torno do que oferta a nova temporada, sem se preocupar com o que ela poderia ter sido, combinado? Ainda agradável em suas situações burlescas, Emily em Paris começa exatamente do ponto de encerramento do último episódio de seu primeiro feixe de capítulos. Mais consciente de suas fraquezas e envolvida sentimentalmente num relacionamento que tem todos os ingredientes para dar errado, a protagonista da série criada por Darren Star mantém o nível de competência e desafia os colegas de trabalho com ideias que apesar de parecerem sem possibilidade alguma de funcionar do ponto de vista europeu, acabam vingando no final e salvando a todos de maiores problemas, haja vista a cartela de clientes de ego inflado e temperamentais da empresa onde presta os seus serviços como uma estadunidense a flertar com a exigente cultura francesa, abundantemente intelectualizada. O produtor que trouxe ao mundo o formidável universo de Candance Bushnell para a televisão nos anos 1990, isto é, Sex and The City, entrega aqui mais um manancial de obstáculos para a jovem que é desafiada cotidianamente e sofre as pressões oriundas das afetividades não apenas dos clientes, mas dos inconstantes profissionais com quem divide o cotidiano profissional.
Sem abordar a pandemia por interesses diletantes, como declarado por Lily Collins em entrevistas, a segunda temporada de Emily em Paris continua a acompanhar a saga de erros e acertos de sua protagonista: as consequências por ainda não ter compreendido o idioma ao menos parcialmente, a falta de lealdade em relação a Camille (Camille Razat), pois como sabemos, os flertes com Gabriel (Lucas Bravo) continuaram e uma breve conversa com o rapaz no episódio final do ano anterior acabou na cama, algo que depõe contra a moça e a coloca numa posição popularmente conhecida no Brasil por “talaricagem”. A sua chefe Madeline (Kate Walsh), com quem se corresponde virtualmente, informa repentinamente estar de malas prontas para visita-la e trabalhar mais de perto, situação que cria uma série de infortúnios no ambiente empresarial, principalmente por ameaçar a posição de Sylvie (Philippine Lerou-Beaulie), personagem que no ano em questão, cresceu e se mantém dentro de dois relacionamentos.
Os figurinos gerenciados por Marylin Fitoussi continuam a ser o grande ponto visual da protagonista, agora ainda mais intensa no quesito excentricidade, com trajes que vão do deslumbrante ao cafona, escolhas que asseguram o tom adotado desde o episódio piloto. Ademais, apesar de ainda focada em suas redes sociais, Emily utiliza o seu tempo em cena para se preocupar com outras questões, como já mencionado, pessoais e profissionais. A sua jornada é acompanhada pela condução musical muito agradável de Chris Allan Lee, trabalho sonoro que embala as imagens da maravilhosa direção de fotografia de Steven Fieberg e do design de produção de Anne Seibel, igualmente competente em sua concepção de espaços, com cores, luzes e adereços que expõem os perfis físicos, psicológicos e sociais do elenco, em especial, a protagonista que parece interessada na adaptação do mundo aos seus interesses, deslumbre que é logo colocado em xeque para que a moça acorde para a vida e tome um direcionamento menos vertiginoso para a sua vida demasiadamente glamourosa e pouco realista.
Os franceses agora falam mais o próprio idioma em cena, tornando a necessidade de compreensão da língua uma das prioridades de Emily, situação propícia para a apresentação do charmoso Alfie (Lucien Laviscount), londrino também enviado para a capital francesa a trabalho, jovem homem que vai se envolver romanticamente com a confusa estadunidense em Paris. Mindy (Ashley Park) também continua sendo desafiada, pressionada por ser uma mulher de família rica que pretende continuar mantendo a sua independência, sem ficar sombreada pela fortuna de seu pai. Na carreira artística, as coisas começam a melhorar para a moça, tornando a sua continuidade na série fundamental para bons momentos de diálogo com a protagonista. Julien (Samuel Arnold) e Pierre (Jean-Christopher Bouve) também proporcionam algumas passagens interessantes na trajetória de Emily, numa temporada que não tem infelizmente não tem o mesmo vigor que a anterior, mas ainda assim traz assertivas homenagens ao cinema europeu, além do tom debochado em relação aos elementos frívolos que compõem determinados aspectos dos Estados Unidos, ironizados em diversos trechos dos 10 episódios que gravitam em torno dos 29 minutos, com exceção do desfecho, um pouco mais longo e com ganchos para um terceiro ano de aventuras, esperamos, mais emocionantes.
Emily em Paris – 2ª Temporada (Emily in Paris, Estados Unidos/França, 22 de dezembro de 2021)
Criação: Darren Star
Direção: Andrew Fleming, Zoe Cassavetes, Peter Lauer
Roteiro: Darren Star, Kayla Alpert, Ali Waller, Joe Murphy, Matt Whitaker, Emily Goldwyn, Sarah Choi, Grant Sloss, Alison Brown
Elenco: Lily Collins, Philippine Leroy-Beaulieu, Ashley Park, Camille Razat, Philippine Leroy-Beaulieau, William Abadie, Samuel Arnold, Bruno Gouery, Roe Hartrampf
Duração: 278 min. (10 episódios)