- ATENÇÃO: As despedidas, votos finais e fofuras de encerramento do ano deixaremos para fazer no tradicional Editorial Plano Crítico, dia 31/12, como de costume.
Esta lista NÃO é apenas de leituras de obras lançadas em 2021, seja no Brasil, seja no exterior. Claro que podem aparecer obras lançadas neste ano, mas a proposta é apenas ranquear as nossas melhores leituras ou releituras de janeiro a dezembro, independente de quando o volume em questão chegou ao mercado.
Cada indicação abaixo usa apenas um parágrafo da respectiva crítica (quando há crítica, claro)! É só clicar nos links para ler os textos completos! Já deixo também o convite para vocês compartilharem nos comentários as suas listinhas de 10 melhores leituras de quadrinhos neste ano! E, caso queiram ver as nossas outras listas sobre o tema, cliquem aqui!
LUIZ SANTIAGO
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Uma coisa que o ano de 2021 me provou, em definitivo, foi o fato de que eu enjoei completamente de quadrinhos de super-heróis. Talvez essa tenha sido a “parte 2” de uma tendência que eu vinha observando na minha lista anual de leituras: o fato de estar lendo cada vez menos quadrinhos (e ainda assim, terminar o ano com centenas de quadrinhos lidos). Em anos anteriores, mesmo tendo percebido essa diminuição de quantidade, havia uma fatia gorda de obras de super-heróis, talvez uns 80 ou 85% de tudo o que eu lia. Hoje, quadrinhos de super-heróis marcam no máximo uns 20% das minhas leituras anuais de quadrinhos. Eu ainda leio, claro, mas é bem menos do que lia no passado.
Confesso que não tenho mais tanto gosto por esse gênero. Poucas semanas antes de compor essa lista, quis pegar alguma coisa do Batman atual (2021) pra ler. Daí me deparei com nomes de eventos que não estava acompanhando, saga de não-sei-o-quê, prelúdio de não-se-de-onde… perdi completamente a vontade de novo. Tenho lido mais quadrinhos antigos, sem frescura nenhuma de acompanhar detalhadamente o que vem acontecendo em todo aquele período. Ou coisas ligadas a eventos que eu já conheço (Na DC, parei de acompanhar em Renascimento. Na Marvel, em Guerra Civil). Se antes, isso “só” me incomodava imensamente, hoje é basicamente o empurrão final que me afaste grandiosamente desse tipo de leitura. O que eu não reclamo, porque quadrinhos fora desse mundo — ou pelo menos nesse mundo, mas sem as zilhões de peculiaridades de continuidade, como os “quadrinhos de Super” em editoras que não seja Marvel e DC, por exemplo — é o que não falta. E tenho estado muitíssimo bem servido deles nos últimos anos.
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10º – Mister No: Dark Lady
Itália, 1991
À parte esse lado da trama ligada a Esse Esse, Dark Lady é uma história que sabe mesclar muito bem diferentes níveis de ação, um pouco de suspense e uma nota bem abrasileirada de confusão, vagabundagem, fofoca e criminalidade. Já falei em outras críticas dessa série e volto a repetir aqui: é impressionante como Guido Nolitta consegue passar muito bem o sabor brasileiro para suas histórias. É fato que compartilhamos certos aspectos culturais com os italianos, mas a maneira como Nolitta escreve é tão autêntica que passaria tranquilamente por um autor nacional da época escrevendo para esse icônico personagem. E isso é um baita elogio.
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9º – Dreadstar Returns
EUA, 2021
Conhecendo o autor, não era possível esperar uma aventura que entregasse tudo o que fosse possível de uma vez só. A bem da verdade, Dreadstar Returns concentra um nível alto de recriação de problemáticas, e isso é algo aplaudível. Mesmo a simplicidade com que o problema inicial é tratado, ao fim, tem uma grande força, por estar aliado a eventos e pessoas do passado da série, um passado que Starlin referencia, homenageia, mas se recusa a fazer-se refém dele. Uma melhor interação entre a primeira e a segunda parte da história poderia trazer maiores benefícios para o volume como um todo, mas o que temos nessa edição é um retorno que faz jus ao personagem e agora só me resta rogar ao Universo para que o Mestre Starlin viva ainda por muitos e muitos anos e dê continuidade ao ciclo que aqui se reinicia.
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8º – Lilith: O Fronte de Pedra
Itália, 2009
Fico extremamente ansioso para ver esse véu se descortinar e tornar a missão de Lilith não apenas uma coleção de dilemas ético-morais, mas também uma missão que pode fazer a personagem se questionar se vale mesmo realizar algo para salvar a humanidade. Afinal de contas, o que o cardo diz sobre os humanos não é mentira. Nós somos uma espécie destruidora e, mais dia menos dia, iríamos encontrar alguém para parar a gente, não é mesmo?
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7º – O Mundo de Edena: Os Jardins de Edena
França, 1988
Em Os Jardins de Edena, Moebius nos faz refletir sobre o isolamento, sobre estar perdido em um lugar onde se tem muita coisa para aprender, mas onde há grande resistência inicial dos aprendizes, quebrada apenas pela passagem do tempo. É um quadrinho sobre deixar-se despir de ideias e comportamentos “civilizados” para adentrar a uma esfera de conhecimento anteriormente inalcançável. Em certa medida, pode ser considerada uma espécie de metáfora para a vida após a morte, para a adaptação de um corpo a um outro plano (o plano espiritual), lugar onde muito aprendizado deve acontecer à medida que vícios e chagas da “outra vida” são curadas.
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6º – Nathan Never: Terra Queimada e Os Predadores do Deserto
Itália, 1992
A defesa de uma posição de poder, o choque entre uma visão puramente exploradora e outra que pretende tirar da natureza apenas aquilo que vai consumir (outra dinâmica de faroeste, tendo a visão de mundo dos colonos versus a visão de mundo dos indígenas) fazem de Terra Queimada e Os Predadores do Deserto um arco crítico, atemporal, com eventos que podemos facilmente ver acontecendo no futuro — para diversos tipos de recursos naturais — e que vemos acontecer em todos os lugares no tempo presente. Como toda boa ficção científica, é uma história que fala muito mais sobre o momento em que foi escrita do que necessariamente sobre o que está por vir. O que é algo bastante triste, se a gente parar para pensar. Mas também é algo que gera uma luz de esperança, de possibilidade de mudança para que não cheguemos a tal ponto no futuro.
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5º – Martin Mystère: Operação Arca
Itália, 1982
Crítica à forma como os Estados Unidos guia as suas investigações e como tratam os seus agentes — muitas vezes utilizados apenas como peças descartáveis “para um bem nacional” — e o jogo com a perspectiva dúbia do personagem principal dão o tom do encerramento do volume. Assim como tivemos em A Vingança de Rá, o autor lida com possibilidades aqui, dando brechas para que o leitor entenda à sua maneira o que de fato aconteceu — de minha parte, achei a ideia da arca real mas puramente tecnológica, algo maravilhoso. Os últimos quadros, porém, deixam claro que pelo menos alguma coisa eles encontraram ali no Ararat. Algo que Java certamente está muito feliz em guardar para si mesmo, enquanto Martin Mystère volta à angústia de não ter certeza de nada sobre esse assunto.
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4º – Dampyr: Sob a Ponte de Pedra
Itália, 2000
Em Sob a Ponte de Pedra, vivemos uma fantasia cheia de referências histórias, com uma arte (de Luca Rossi, que começou na série em Fantasmas de Areia, e que aqui está mais à vontade para criar distorções e imagens assustadoras) que não se faz de rogada ao adotar a base da estética expressionista, abertamente referenciada no texto. É uma história importante para o cânone de Dampyr, mas mais do que isso, é uma história que faz um dos melhores usos que eu já vi nos quadrinhos da geografia e das possibilidades históricas, simbólicas e visuais que um território pode ter. Uma daquelas histórias que dá até orgulho de falar que a gente leu.
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3º – Sandman: A Casa de Bonecas
EUA, 1989 – 1990
A Casa de Bonecas é uma representação da vida em miniatura, em um momento de crise. Nela encontramos uma fauna rica de personagens que atravessam a nossa existência e que não fazem ideia daquilo que podemos ser. Às vezes nem nós sabemos sobre o nosso potencial destrutivo, como a personagem-Vórtice do arco, com sua vida de cabeça para baixo sem saber o que estava de fato acontecendo ao seu redor. Neil Gaiman reflete sobre sonhos de grandeza, sobre causar dor aos outros e sobre tentar fugir (dormindo ou acordado) das dores que sofremos. É um arco bastante inteligente na maneira como apresenta novos Perpétuos e na maneira como explora mais algumas camadas da vida sob o ponto de vista da cultura e da arte. Um presente denso e reflexivo que costura o nosso cotidiano à fantasia onírica e cheia de significados, num enredo difícil de superar.
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2º – Júlia Kendall: Jerry Desapareceu
Itália, 1999
Esta é a sensação que nos toma ao final de Jerry Desapareceu. Uma mistura de ódio, nojo e pesar compõem a conclusão do caso e carregam a nota de banalidade que sombreia ainda mais o crime, se é que isso é possível. O tipo de ato que não deve deixar ninguém “acostumado” com ele, mas no mundo em que vivemos (e notem que esta história é de 1999!) cada vez mais caímos nesse barranco. É tanta tragédia, tantos atos vis, em tantos lugares e tão continuamente, que de certa forma ficamos anestesiados diante das novas notícias sanguinárias. Manter a sensibilidade diante disso (que é a proposta de Júlia para Webb) é a coisa mais difícil e mais essencial a se fazer.
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1º – A Última História de Galactus
EUA, 1984 – 1985
Infelizmente John Byrne não conseguiu colocar um ponto final oficial neste trabalho. Em 15 de fevereiro de 2005, em resposta a uma pergunta feita em seu Fórum, o autor confirmou que esta aventura terminaria com uma luta de Eras e Eras entre Galactus e o Vigia (não Uatu!) e, num rompante de raiva para garantir sua vitória, o comedor de planetas sugaria toda a energia que ainda restava do Universo e quebraria a sua armadura, retiraria o seu capacete e toda a energia absorvida seria liberada. Isso mataria o Vigia, criaria uma nova Galactus (a antiga Nova II) e seria o Big Bang de um novo Universo… Chega a ser poético e asimoviano de tão lindo!
RITTER FAN
Assim como aconteceu em 2020, 2021 não foi um ano em que eu especialmente tenha me debruçado sobre quadrinhos. Minhas leituras foram mais limitadas a HQs ditadas pelas necessidades do site (como aniversários, lançamentos recentes, obras relacionadas com séries e filmes sendo lançados e coisas assim) do que qualquer outra coisa. Não sei, mas talvez eu tenha perdido o interesse que tinha nesta mídia ou talvez seja um estranho efeito da pandemia, não saberia dizer. Mesmo assim, li muita coisa bacana – incluindo as releituras de Sweet Tooth e Saga, a primeira em razão da série do Netflix e, a segunda, em razão do vindouro fim do hiato – e pelo menos uma HQ realmente surpreendente, daquelas que você se interessa pela premissa e é engolfado pela execução (falo do meu segundo lugar). Quem sabe em 2022 eu não volto a avidamente devorar HQs como em priscas eras?
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10º – Mulher-Maravilha: Terra Um – Volume Três
EUA, 2021
A primeira coisa que devo dizer dessa trilogia de graphic novels de Grant Morrison e Yanick Paquette sobre a Mulher-Maravilha é que todo os “homens machos”, daqueles que se acham superiores às mulheres – e também aqueles que acham que não são superiores, mas agem como se fossem sem sequer perceberem – deveriam ser obrigados a lê-la até compreenderem que, na sátira, pois a pegada é sem dúvida satírica no que se refere aos homens da história, os autores encapsulam perfeitamente a natureza do sexo masculino. Sempre defendi que a Natureza Humana é beligerante, mas a grande verdade é que não é a Natureza Humana, mas sim, apenas, mais ou menos metade dela, a metade que não pode gerar vida.
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9º – Batman: Terra Um – Volume Três
EUA, 2021
Foram três anos entre o primeiro e segundo volumes de Batman: Terra Um e, agora, nada menos do que seis anos para chegarmos ao terceiro e, aparentemente, último volume da sensacional reimaginação da origem do Homem Morcego por Geoff Johns, com Gary Frank e Jon Sibal na arte. Se isso não é um atestado de que a DC Comics criminosamente relegou sua linha de graphic novels Terra Um ao quase completo ostracismo, não sei o que é. O que tinha todo o potencial para ser o equivalente ao universo Ultimate da Marvel, acabou infelizmente sendo uma reunião de interessantíssimas histórias que não parecem ter muito futuro.
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8º – Chew: Taster’s Choice
EUA, 2009
Não li os encadernados seguintes de Chew ainda, mas, a julgar pelo que John Layman faz aqui em Taster’s Choice, o arco inicial, não creio que eu vá demorar muito para devorar (he, he, he) os demais capítulos desta história que ele, juntamente com o desenhista Rob Guillory, que toma conta de toda a arte, criaram em 2009 e que durou até 2016, com 60 edições ou 12 volumes. O que a dupla faz no volume inicial é uma fascinante história de origem mesmo considerando que o protagonista, Tony Chu, e o mundo em que vive, assustadoramente parecido com o que vivemos neste momento, já “sejam o que eles são” desde a primeira página, que prende o leitor não só pela premissa inusitada, como pela forma quase cinematográfica com que a história é contada e pelos personagens cativantes que são apresentadas.
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7º – Duna: Graphic Novel – Vol. 1
EUA, 2020
Considerando a vastidão de obras literárias que já ganharam adaptações em quadrinhos, chega a ser uma surpresa constatar que Duna, o romance de ficção científica mais vendido no mundo, jamais tenha sido convertido para a Nona Arte. Claro, há a adaptação pela Marvel Comics do longa de 1984 dirigido por David Lynch, mas é só. No entanto, a dupla Brian Herbert e Kevin J. Anderson, responsável pela expansão do universo de Frank Herbert com o lançamento de diversos prelúdios e continuações literárias, parece finalmente disposta a alterar esse cenário com duas HQs quase simultâneas em antecipação à adiada versão cinematográfica de Denis Villeneuve: a adaptação do primeiro livro em uma graphic novel de três volumes, o primeiro sendo objeto da presente crítica, e de Dune: House Atreides, em uma maxissérie em 12 edições.
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6º – O Fantasma: A Irmandade Singh
EUA, 1936
Mesmo com os problemas naturais de uma primeira história de uma criação de mais de oito décadas publicada diariamente em jornal, A Irmandade Singh é uma leitura muito agradável, com Falk decididamente estabelecendo firmemente, mesmo que mudando de ideia no meio do caminho, um personagem inesquecível dos quadrinhos. O Fantasma, como sua própria história de origem, parece capaz de sobreviver a qualquer evolução, mantendo-se firme no imaginário de gerações e gerações de leitores de quadrinhos. Um verdadeiro triunfo da imaginação.
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5º – Hulk: Futuro Imperfeito
EUA, 1992 – 1993
Futuro Imperfeito é um excelente exemplo de concisão narrativa e qualidade artística que entrega uma história simples, mas memorável e um vilão asqueroso, mas inesquecível sem que seja necessário criar eventos complexos, longos e cheios de tie-in. A minissérie de Peter David e George Pérez é um exemplo de criatividade e ousadia que deveria ser seguido mais vezes.
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4º – M.O.D.O.K.: Head Games
EUA, 2020 – 2021
Uma das maiores e mais agradáveis surpresas televisivas de 2021 foi, sem dúvida alguma, a série em stop-motion dedicada a ninguém menos do que M.O.D.O.K., o surreal personagem cabeçudo da Marvel Comics, criada por Jordan Blum e Patton Oswalt, com o primeiro servindo de showrunner e o segundo emprestando sua voz ao personagem titular. Curiosamente, considerando o quão pouco alardeada foi a série, ela foi imediatamente precedida por uma minissérie em quadrinhos em quatro edições, publicada entre dezembro de 2020 e abril de 2021, escrita por Blum e Oswalt e que serve como uma forma de se introduzir o leitor ao personagem e dar pistas do que poderia ser a série.
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3º – Sweet Tooth – Vols. 1 a 6
EUA, 2009 – 2013
Sweet Tooth que, no Brasil, foi publicada com o subtítulo Depois do Apocalipse, que eu decidi retirar de minhas críticas por ser redundante, foi uma série em quadrinhos composta de 40 edições publicadas entre 2009 e 2012 pela infelizmente finada Vertigo Comics e que foi criada, escrita e desenhada por Jeff Lemire, com cores de José Villarrubia e que, recentemente, ganhou uma “continuação”, batizada simplesmente de Sweet Tooth: O Retorno, como parte da estratégia para chamar atenção para a propriedade em razão de sua adaptação televisiva pelo Netflix. Descrita comumente de “Bambi encontra Mad Max“, a obra bebe muito francamente dessas duas fontes, tendo Bambi inclusive como obra diretamente mencionada, com versões dos personagens clássicos povoando os sonhos do protagonista.
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2º – O Último Deus: Livro I das Crônicas de Fellspyre
EUA, 2019 – 2021
Apesar de não ser comum para uma editora mainstream de quadrinhos, é compreensível que a DC Comics tenha querido aproveitar-se da revitalização das histórias de alta fantasia – ou high fantasy – bem no estilo O Senhor dos Aneis ou Dungeons & Dragons. O que é incrível e realmente fora de esquadro é que The Last God (ou O Último Deus em tradução direta já que a HQ não foi ainda publicada no Brasil) é uma aposta de grande qualidade em praticamente todos os seus quesitos, da história à arte, das caracterizações dos personagens à ameaça que eles precisam enfrentar, da abordagem adulta e extremamente violenta aos detalhes da construção de mundo, que há muito tempo não se via em qualquer uma das duas grandes editoras de quadrinhos americanas.
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1º – Saga – Vols. 1 a 9
EUA, 2012 – 2018 (em hiato)
Brian K. Vaughan escreve e Fiona Staples desenha e colore essa incrível série que revitaliza o conceito de “ópera espacial”, muito na linha do que George Lucas criou, na década de 70, com Star Wars. Aliás, a comparação entre Saga e Star Wars é completamente inevitável. As duas obras são extremamente imaginativas, com personagens cativantes e uma linha narrativa que prende os leitores/espectadores. Não há dúvidas que Vaughan inspirou-se no conceito amplo de uma enorme saga interestelar para criar sua mais nova série.
KEVIN RICK
Por conta da Corrida Literária, 2021 foi um ano que raramente li quadrinhos. Felizmente, nessa reta final de novembro/dezembro, por conta do Especial da Image Comics, eu consegui apagar um pouquinho o buraco anual com algumas HQs independentes maravilhosas da Editora. E em 2021 também fui apresentado ao maravilhoso universo da Editora Sergio Bonelli. Eis o ranking!
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10º – Crossover: Crianças Amam Correntes
EUA, 2021
Acima de tudo, temos o roteiro de Cates, que sim tem problemas no ritmo e desenvolvimento da narrativa objetiva, mas que assume um maravilhoso exercício com o leitor de dar uma longa olhada na Nona Arte, seus personagens e o efeito que esse meio teve sobre nós como cultura, povo e no âmbito mercadológico, abordando principalmente o poder de permanência do fictício e contemplando nossa mortalidade frente a personagens que amamos. E aí, quem é mais real?
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9º – Extremity
EUA, 2013
Confesso ter uma pontinha de desapontamento com a narrativa apressada – poderíamos facilmente ter o dobro, ou até mesmo o triplo de capítulos -, que “come” o desenvolvimento de antagonistas interessantes, e até mesmo do cerne familiar dos clãs tão bem apresentados, ficando aquele gostinho de quero mais, e um final um tantinho anticlimático pelo desfecho abrupto, passando uma sensação de pressa do autor. Ainda assim, Extremity é uma violenta, pungente, taciturna e baita divertida jornada nos dramas pessoais de Thea, tocando em assuntos artísticos inovadores no molde vingativo, nunca adentrando um sentimentalismo barato, mas sim arrebatando o leitor emocionalmente. Uma HQ sobre a mudança dos caminhos da vida, como os próprios nomes dos volumes especificam, artista e guerreira.
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8º – Pulp
EUA, 2020
Pulp é um quadrinho que trabalha a melancolia de resgate do faroeste com a sensação de incerteza do futuro do mundo das guerras mundiais e das crises econômicas. Há, como eu disse, um subtexto cínico de Brubaker, em relação à violência cíclica, independente da época. O remorso e a mortalidade de Max trabalham todos esses conceitos narrativos no campo particular, mergulhados em um miolo neo-noir de um velhinho tentando revisitar seu eu do passado, confrontando fantasmas, ao mesmo tempo que se conforma com a morte. A sua e a do seu período. Agora revisitadas através do pulp.
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7º – Chew: Taster’s Choice
John Layman – EUA, 2009
Em outras palavras, Taster’s Choice usa premissas absolutamente fascinantes e tropos clássicos de quadrinhos e filmes para literalmente pegar o leitor pelo estômago de tal forma que é uma luta para não ceder à tentação e correr para engolir o volume seguinte em uma dentada só. A julgar por esse começo, Chew parece ser uma deliciosa – ainda que por vezes revoltante e nojenta – jornada por um mundo estranho e indigesto que simplesmente não dá para parar de ler.
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6º – Lilith: A Bandeira do Rei Morte
Itália, 2009
A convivência de Lilith entre os piratas deu uma cara diferente ao andar da narrativa. Descobrimos mais da personagem e o do tipo de intervenções e até brincadeiras que ela pode fazer para conseguir o que quer. A Bandeira do Rei Morte é certamente uma das histórias mais interessante desse gênero de exploração marítima, pilhagem e códigos que transitam entre um tipo estranho de democracia e a anarquia, como bem denomina o autor no texto de abertura da edição. Mais uma acertada navegação de Luca Enoch pela vida de sua cronoagente.
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5º – One Piece: Arlong Park
Japão, 1999
O embate final termina por ser um paradoxo de experiência na minha opinião. Toda a construção taciturna e melancólica dão o tom dramático do clímax, mas, nossa, como a luta final é divertida e cômica. A dinâmica estúpida do bando – muito por culpa de Luffy – dão um toque humorístico gostoso ao final do arco, ao mesmo tempo que nunca nega a dramaticidade bacana apresentada antes. Arlong Park traz os temas comuns da série e os elevam com uma história madura e sentimental, apresentando o melhor antagonista da obra até aqui – ainda acho Arlong um dos melhores em todo o mangá -, no sensacional arco de Nami em busca de liberdade.
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4º – Júlia Kendall: A Sombra do Tempo
Itália, 2000
Trazendo uma edição extremamente diferente das anteriores, Berardi cria em As Sombras do Tempo uma intimidade com o drama mais pessoal dos personagens, seja o crime ou a rotina, enquanto desenvolve uma investigação dilatada pelas complexidades psicológicas do ser humano – aliás, é preciso dar mérito para a arte de Pietro Dall’Agnol, que passa bem essa ideia de memória com o traço “rascunhado” e os desenhos de “fotografia antiga” nos flashbacks. Ainda sinto um pouco de problema com as resoluções repentinas, mas aqui a surpresa não é nem uma surpresa propriamente dita, mas o desfecho orgânico de uma história poderosa sobre o crime em contextos intempestivos e ocasionais, além dos aprendizados da realidade.
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3º – Berserk: A Era de Ouro
Japão, 1991-1993
Kentaro Miura tinha plena consciência do poder de sua história, se tornando influência para várias obras de fantasia em múltiplas mídias, e continuaria chocando e entretendo por muitas décadas. Infelizmente, seu período conosco terminou, mas seu trabalho continua eternizado. Descanse em paz, Kentaro Miura. Nós agradecemos.
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2º – The Good Asian – Vol. 1
EUA, 2021
O primeiro volume de The Good Asian é uma fantástica história clássica de detetive, cheia de boas reviravoltas, personagens coadjuvantes interessantes e desdobramentos inesperados, mas também é um exame ainda mais intrigante da vida sino-americana no final dos anos 1930. Pornsak Pichetshote conseguiu criar uma trama que equilibra contexto histórico com estudo de personagem, micro e macro trabalhando em uníssono uma história sobre identidade em um enredo detetivesco. O texto de Pichetshote fica ainda melhor com a criatividade e o trabalho detalhista de artistas que milimetricamente criam uma ficção histórica autêntica e exuberantemente noir. Contando com um desfecho bombástico e com repercussões sociais, só podemos ficar ansiosos com a resolução do caso de Edison Hark.
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1º- Invencível: Ainda de Pé
EUA, 2019
Além das “coreografias”, Ottley é visualmente brutal. Cada golpe é impetuoso e cruel. Alguns até asquerosos. O aparecimento de Eve e Oliver na batalha, e seus graves ferimentos, também funcionam muito bem para aumentar o drama. Temos também a personalidade repugnante, perversa e estranhamente carismática de Conquest, além da sua fantástica caracterização, que é outro fator em criar pura aflição. Tudo isso culmina em uma das melhores páginas de ação que já li em quadrinhos, onde Ottley justapõe a imagem do Invencível batendo no Conquest com vários pequenos painéis ao fundo. É de uma fluidez brutal, palpável em sua dor e hostilidade, e o mais próximo de animação que uma HQ pode chegar. O último capítulo do volume traz em foco os traumas desses eventos, finalizando uma obra-prima de ação dramática. É, os Dias Felizes acabaram.