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Crítica | O Caso do Cão Uivador (Perry Mason #4), de Erle Stanley Gardner

Intolerantes e infames.

por Luiz Santiago
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A trama de O Caso do Cão Uivador levou brevemente os meus pensamentos, mesmo não tendo tantos elementos dramáticos diretamente ligados, à uma fantástica obra de Georges Simenon chamada O Cachorro Amarelo. Em ambas as histórias existe um cachorro em cena, ligado a um personagem que é assassinado. E muitas particularidades dessa ligação é que fez o meu pensamento estreitar certas relações entre os livros. À parte esse aspecto da narrativa, todavia, a obra francesa e a americana são muitíssimo diferentes no tratamento que dão ao assassinato, aos envolvidos com o dono do cão e ao próprio resultado das investigações.

Neste The Case of the Howling Dog, Erle Stanley Gardner começa com uma intriga que parece a mais boba, a mais banal e neurótica possível. Um homem chamado Arthur Cartright chega ao escritório do advogado Perry Mason e faz um relato que, em nada, se parece com algo que o renomado profissional pegaria para resolver. Ele reclama de um cão, na casa da frente, que não para de uivar. Em adição a essa reclamação, faz um relato que indica divergências entre vizinhos (tudo isso acontecendo num bairro nobre da cidade), pergunta sobre questões testamentárias e em que condições específicas alguém poderia receber a sua herança. É um início muito interessante de livro, que captura a nossa atenção pela insólita queixa e também pela forma como Mason guia o caso em seus primeiros passos.

Nos livros anteriores, vimos Perry Mason agir de maneira não necessariamente “correta” para conseguir montar o seu caso e livrar seus clientes da prisão ou da pena de morte. Mas até o momento, este caso do cachorro que latia muito foi o que mais mostrou essas andanças do personagem sobre gelo fino. Aqui, ele coordena “de maneira legal”, atos como falsificação de identidade, suborno, manipulação, adulteração de testemunhas ou simplesmente desonestidade na hora de guiar alguma conversa ou dizer algo que tem em mente, desviando a atenção de todo mundo para a sua verdadeira intenção, forçando uma de suas personagens a enfrentar o júri e pouco a pouco descortinando acontecimentos-chave por trás de todo o caso.

Ao esconder testemunhas, contratar uma atriz para se passar por uma pessoa suspeita e vazar informações falsas para a imprensa, Mason adota uma posta antiética e moralmente questionável, mas ao mesmo tempo mantém todas essas ações dentro de um espectro que ele consegue defender como “legal“. Por mais de uma vez ele precisa responder a Della, por exemplo, que não é júri e nem juiz, mas advogado, e nessa posição, o seu trabalho é assegurar, nas normas da lei, que seu cliente tenha a melhor defesa possível — tendo que lidar aí com o jogo sujo da promotoria e diversos outros tropeços no meio do caminho que o Estado e suas instituições colocam. Há quase uma vingança do personagem contra a burocracia estatal quando ele, enfim, passa de investigador para advogado em exercício, nos capítulos finais do livro que se passam no tribunal.

O Caso do Cão Uivador é um livro com uma ótima reviravolta, numa linha de resolução que vai tirando atitudes impressionantes dos personagens em diferentes momentos de suas vidas (note que ações passadas têm um peso grande aqui) e que consegue desenvolver cada bloco o suficiente para tornar todo mundo um forte suspeito ou pelo menos indiretamente envolvido. O bacana é que, por muito tempo, a gente não sabe exatamente que tipo de problema existe para ser investigado. Quando as coisas se revelam, porém, mostram-se muito piores do que a gente imaginava. O tipo de compensação dramática, na literatura policial, que continua sendo uma das mais interessantes.

Perry Mason – Livro 4: O Caso do Cão Uivador (The Case of the Howling Dog) — EUA, 1934
Autor: Erle Stanley Gardner
Serialização original: Liberty Magazine, 13 de janeiro a 17 de março de 1934
Publicação original: William Morrow and Company, junho de 1934
Edição lida para esta crítica: Livros do Brasil (1982)
Tradução: Sónia Guimarães
384 páginas

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