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Crítica | Fedora (1978)

Billy Wilder reflete sobre o fim da Era de Ouro

por Fernando Campos
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Penúltimo filme de Billy Wilder, Fedora decreta o fim da era “glamourosa” de Hollywood, segundo palavras da própria personagem que encabeça o título do longa. É simbólico que uma produção de Wilder pontue isso, uma vez que a carreira dele alavancou durante a Era de Ouro do Cinema Americano, período marcado, por exemplo, pelo studio system, star system e obras de tom escapista. A presença de grandes estrelas começou a ter grande importância na divulgação de filmes e foi Wilder, inclusive, que ajudou a aclamar algumas delas, como Jan Sterling em A Montanha dos 7 Abutres.

Porém, em 1978, ano de lançamento de Fedora, a Nova Hollywood priorizava filmes mais realistas e preocupados com temas do cotidiano, culminando em obras mais violentas e melancólicas, como Operação França, O Poderoso Chefão e Taxi Driver. Décadas depois, analisando o cinema estadunidense atual, com celebridades estrelando grandes produções de super-herói, é possível dizer que a Era de Ouro deixou sua marca e que a promessa da Nova Hollywood de renovar a indústria americana não foi assim tão profunda. No entanto, sem saber o que vinha pela frente, Wilder reflete sobre o fim dessa época em Fedora.

O longa inicia durante o funeral de Fedora (Marthe Keller), uma famosa atriz afastada das telas há muitos anos. Na cerimônia, um produtor de cinema, Barry Detweiler (William Holden), relembra as duas últimas semanas, em que tentou convencê-la a participar de uma nova versão de Anna Karenina, o que culminou na morte da artista.

Definitivamente, que há de mais interessante em Fedora são os temas e reflexões sobre a indústria cinematográfica americana, uma vez que tanto história quanto desenvolvimento de personagens são precários. O roteiro pouco explora a dinâmica entre os personagens, o que poderia aumentar a dramaticidade, priorizando uma série de flashbacks com narração em off para preparar o terreno para uma reviravolta absolutamente previsível. Muito melhor do que tentar surpreender o público com o destino de Fedora, seria explorar o impacto que eventos negativos tiveram nela e na família.

O filme, em uma provocativa cena em que vemos a protagonista atuando pela primeira vez, até que consegue estabelecer Fedora como uma pessoa narcisista e que usa a beleza para conquistar o que quer. Contudo, não vemos essas características sendo exploradas em momentos com enorme potencial dramático, como no acidente envolvendo um procedimento estético. Além disso, Detweiler, responsável por conduzir a narrativa, tem no romance pela atriz sua grande motivação para percorrer o mundo atrás dela, mas essa relação só é trabalhada em um momento em que os dois conversam em um camarim.

Permanecendo apenas nesses exemplos, fica claro como é frágil tanto o arco quanto o vínculo dos personagens. A reviravolta apresentada no clímax de Fedora tinha potencial até de transformar a obra numa espécie de horror, como acontece em O Que Terá Acontecido a Baby Jane?, que inclusive trata de temas parecidos, mas a exposição excessiva rompe qualquer possibilidade disso. Até mesmo a direção de Wilder fica num lugar comum, conduzindo bem as atuações e construindo planos com elegância, mas sem tentar extrair o verdadeiro potencial dramático da história.

Apesar disso tudo, Fedora não é um filme ruim. Dirigido por Wilder e lançado durante a Nova Hollywood, é impossível ignorar as reflexões e o contexto do longa. Ao mesmo tempo que parece lamentar o fim da Era de Ouro, o diretor também critica aspectos lamentáveis dessa época, como a falta de oportunidades para atrizes mais velhas e o culto excessivo à beleza e juventude, culminando na disparada de procedimentos estéticos para que parecessem mais jovens, nem sempre por vontade própria. Ao mesmo tempo, Wilder condena o realismo excessivo e reflete sobre o que é atuar de verdade dentro do audiovisual, como quando Fedora diz: “as pessoas se apaixonam pelo rosto que veem na tela. O resto não importa”.

Inclusive, essa passagem de Fedora lembra uma fala do próprio Wilder sobre problemas que teve com Marlyn Monroe em Quanto Mais Quente Melhor, elogiando a atriz, apesar dos perrengues que teve com ela. Ele disse: “Qualquer um pode lembrar as falas [de algo], mas é preciso ser um verdadeiro artista para vir a palco sem lembrar nada e ainda ter o desempenho que ela teve”. Ao contrário do que algumas premiações parecem cultuar, atuar vai além de decorar falas, gritar ou chorar. Acima de tudo, o bom ator precisa prender a atenção do público, ocupar o quadro de forma atraente e apresentar um personagem para a audiência convincentemente. A farsa que Fedora revela no final do filme prova justamente isso. O grande ator precisa ter uma função imagética no quadro e, para isso, às vezes basta um rosto.

Fedora – Alemanha e França, 1978
Direção: Billy WIlder
Roteiro: Billy Wilder e I. A. L. Diamond (baseado na obra de Tom Tryon)
Elenco: William Holden, Marthe Keller, Hildegard Knef, José Ferrer, Frances Sternhagen, Mario Adorf, Stephen Collins, Henry Fonda, Michael York, Hans Jaray, Gottfried John, Arlene Francis, Elma Karlowa, Ellen Schwiers, Ferdy Mayne, Peter Capell, Panos Papadopulos
Duração: 114 min

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