- Há spoilers. Leia, aqui, as críticas de todos os episódios da série e, aqui, de todo nosso material do universo The Walking Dead.
Fecha a matraca, Morgan!!!
– coadjuvantes de luxo em linha de diálogo cortada do episódio
Claro que isso não aconteceu, mas, em minha mente, na medida em que assistia USS Pennsylvania, ficava imaginando uma discussão ferrenha entre a diretora Heather Cappiello e os roteiristas Nazrin Choudhury e Nick Bernardone em que a primeira queria fazer um episódio intimista, de espaço confinado, retornando às raízes do horror de zumbi, enquanto os outros dois se recusavam a aceitar algo assim e teimavam em inserir diálogos existencialistas mequetrefes e novos exemplos de culpas variadas e respectivas tentativas de expiação, para dar um verniz a Fear the Walking Dead que a série nunca realmente soube trabalhar. O resultado foi um “episódio cabo de guerra”, que hora caminhava em uma direção clássica e, convenhamos, alvissareira e outras várias horas parava tudo para diálogos bobalhões intermináveis em especial focados no desgastado e perdido Morgan Jones.
Logo na abertura, com Teddy, o maluco-mor, conversando – ou melhor, doutrinando – Dakota, digo Sioux, ou a maluca-júnior em um escuro opressor em que víamos os dois, imediatamente detectei uma promessa de coisa muito boa em USS Pennsylvania. A insanidade convergente dos dois, que logo é acompanhada pela de Riley, o maluco-minion, revelado como ex-marinheiro daquele mesmo submarino, uma explicação simples e eficiente que torna todo o plano apocalíptico de Teddy instantaneamente crível, é algo saboroso de se ver e o verdadeiro destaque do roteirode Choudhury e Bernardone, talvez o único momento de convergência verdadeira e eficiente entre texto e imagem do episódio.
E o pior é que todo o restante, com Morgan e seus coadjuvantes desimportantes (alguns deles sequer entram no submarino e outros só têm suas vozes ouvidas, o que revela o quanto a série inchou de personagens e o quanto os showruunners não fazem ideia do que fazer com eles) entrando no submarino tinha tudo, absolutamente tudo para trazer momentos de tensão e sustos genuínos, algo que há muito não se vê na série. E tudo começa bem, com o primeiro zumbi marinheiro atacando Morgan logo quando ele desce da escada, em um jump scare maroto, mas começa a degringolar imediatamente depois com aquela conversa estranhíssima dele com Grace, dizendo que ela é uma espécie de messias que, na ausência dele, tem que guiar o povo para a Terra Prometida. O que raios foi isso, minha gente? Já não basta um maluco-mor? Precisamos de dois? E o mais hilário é Grace concordar, ainda que tacitamente, com essa sandice e ficar para trás para servir de contato com o pessoal da base da marinha, com perguntas genéricas do tipo “para onde vamos agora?” sendo que nem ela, nem o pessoal de lá jamais poderia responder a essa pergunta com alguma coisa que não fosse “sei lá, minha filha!”.
Mas a coisa vai além. Morgan e seu eterno complexo de culpa, de salvador da pátria, de zen-budista anti-violência, faz de tudo para convencer seus companheiros, em meio a um submarino no breu total com 150 desmortos e três malucos na ponte prestes a disparar mísseis nucleares, que ele – e somente ele – deve se sacrificar pelo bem comum, que ele deve isso a todos os demais e blá, blá, blá, algo que ele repete umas 18 vezes ao longo dos minutos seguintes. Só que não para por aí (isso aqui está parecendo anúncio das facas Ginsu ou meias Vivarina…), pois Strand, outrora um fascinante personagem, entra na onda de salvador da pátria e, de repente, passa a competir com Morgan pela honra de acabar com a raça do barbudo insano e de seus dois capangas (aliás, onde estão os demais capangas do sujeito, já que seria óbvio que eles deveriam estar protegendo submarino até o lançamento dos mísseis, não é mesmo?), o que, na cabeça dele, significa arremessar o amigo(?) no chão para ele ser comido por seis zumbis, quebrar seu machado badass e sair como um doido (outro!) somente para ser parado por Dakota que, no lugar de atirar de uma vez, ficando falando asneira até Morgan que, óbvio, jamais morreria assim, a derruba e ele mesmo começa outro discurso para Strand.
Tudo estava indo tão bem nas últimas semanas para a série. A chegada de John Dorie Sr. criando as amarras necessárias para tornar tudo bem coeso, inclusive o sacrifício do filho e o messianismo de Teddy, foi lindo, mas ele, aqui, não só vira mais um coadjuvante de luxo, como não oferece mais do que um ranger de dentes por rádio para Teddy, em um episódio filler, mas do tipo ruim, que só conseguiu mesmo foi quebrar a estirada de bons episódios que esse final estava tendo. Com um míssil disparado, fica a torcida para ele explodir ali mesmo, matar todo mundo e a próxima temporada da série ser protagonizada por baratas mutantes, pois prefiro isso do que continuar a ver Morgan filosofando muito e não fazendo nada. Cappiello perdeu feio esse cabo de guerra, mas a culpa não é dela, que fique bem claro!
Fear the Walking Dead – 6X15: USS Pennsylvania (EUA, 06 de junho de 2021)
Showrunner: Andrew Chambliss, Ian Goldberg
Direção: Heather Cappiello
Roteiro: Nazrin Choudhury, Nick Bernardone
Elenco: Lennie James, Alycia Debnam-Carey, Maggie Grace, Colman Domingo, Danay García, Austin Amelio, Alexa Nisenson, Rubén Blades, Karen David, Jenna Elfman, Demetrius Grosse, Michael Abbott Jr., Zoe Margaret Colletti, Devyn A. Tyler, Christine Evangelista, Peter Jacobson, Cory Hart, Raphael Sbarge, Colby Hollman, John Glover, Nick Stahl, Sahana Srinivasan, Keith Carradine
Duração: 44 min.