Home TVEpisódio Crítica | Falcão e o Soldado Invernal – 1X06: One World, One People

Crítica | Falcão e o Soldado Invernal – 1X06: One World, One People

por Ritter Fan
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  • Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios.

Falcão e o Soldado Invernal, segunda série da Fase 4 do Universo Cinematográfico Marvel, tinha como objetivo primordial lidar com a passagem do legado do Capitão América para Sam Wilson, escolhido por Steve Rogers para ser seu sucessor. Para fazer isso, a produção valeu-se de um texto com alta carga política que trabalhou a questão do racismo como elemento basilar da narrativa. E, nessa linha, a série comandada por Malcolm Spellman cumpriu muito bem seus objetivos, convencendo o espectador sobre o nascimento de um novo Capitão América com simbolismo talvez ainda mais potente.

Mas cumprir bem seu objetivo é obrigação mínima de qualquer obra de arte, em qualquer mídia, pelo que isso não é exatamente um elogio definitivo, como muitos tendem a achar que é, mas sim o começo de qualquer análise. A pergunta maior é se, ao cumprir seu objetivo, a série foi além dele e, se foi, como conseguiu isso, aí tanto em aspectos narrativos, quanto em aspectos técnicos. E, olhando dessa forma, One World, One People, apesar de inegavelmente fazer o que tem que fazer, realmente não consegue despontar em momento algum, desde quando a pancadaria começa com a chegada triunfal de Sam Wilson, agora fardado de Capitão América com asas, até quando ela acaba e os intermináveis epílogos à la O Retorno do Rei então se iniciam.

Partamos então pela escolha estética de se fazer com que as sequências de ação, que tomam 3/4 do episódio, aconteçam à noite. Não só isso reduziu substancialmente o impacto desses momentos, inclusive e especialmente as afirmações e reafirmações visuais de que Sam Wilson agora é mesmo o Capitão América, como a fotografia e a montagem não conseguiram elevar as sequências a mais do que tentativas de se reduzir a carga de CGI, no truque mais velho do livro de regras de Hollywood. Se é para carregar nas sequências noturnas, então que elas pelo menos sejam realmente bem executadas, e não uma sucessão de socos e chutes com cortes frenéticos ou de sequências aéreas ofuscadas pelo manto da noite. Se eu elogiei a ação inicial de New World Order, aqui eu não posso fazer o mesmo, infelizmente.

Em termos de roteiro, Sharon Carter foi uma presença marretada no episódio. Se suas ações anteriores nas sombras como Mercadora do Poder (ainda bem que confirmaram a identidade dela como o misterioso personagem, pois seria ridículo introduzirem alguém novo a essa altura) faziam algum sentido, mesmo que tenhamos que fechar os olhos para o fato de ela ter levado a dupla de heróis e mais Zemo até o valioso cientista fabricante do soro de supersoldado em Power Broker, sua materialização em Nova York para ajudar Sam e Bucky pareceu-me medida desesperada para encaixá-la na cena pós-créditos em que ela, ao que tudo indica, se torna agente dupla, o que é sem dúvida é um desenvolvimento interessante, mas que não exigia que ela aparecesse no episódio o tempo todo sem ter função maior do que matar Karli, o que poderia ter sido feito de outra maneira qualquer.

Por outro lado, foi alvissareira a escolha de não vilanizar John Walker completamente. Seria muito fácil – e muito ruim – fazer o personagem descambar para o “modo assassino”, mas tudo ao redor dele, diferente do caso de Sharon, acabou funcionando muito bem, com sua presença como aliado hesitante de Sam e Bucky, inclusive com direito à tentativa de resgate do caminhão com reféns, afastando o ex-Capitão América da unidimensionalidade. Walker é interessante demais para ser usado dessa forma, pelo que, mesmo tendo literalmente manchado o escudo, ele mostrou-se ainda fiel a seus princípios, para todos os efeitos ainda um verdadeiro herói. Sua transformação final em Agente Americano, pelas mãos da Condessa Elaine Benes, foi condizente com tudo o que veio antes e parece preparar o personagem para um futuro no mínimo ambíguo e com grande potencial de drama psicológico que o coloque entre o heroísmo e a vilania.

Falando no lado psicológico da coisa, Bucky manteve-se como coadjuvante de luxo (o que não é demérito, apenas um fato) e ganhou um desfecho digno para seu passado como Soldado Invernal, mesmo que seu codinome, no título alterado da série ao final, tenha se mantido este e não Lobo Branco (ainda bem, diga-se de passagem). O arco do personagem, porém, inegavelmente ficou à sombra do de Sam, como deveria ser mesmo, sendo resolvido sem maiores dramas ou a necessidade de se complicar a narrativa.

Afinal, a complicação ficou mesmo para o lado do novo Capitão América. Confesso que não gosto e nunca gostei da fusão do Capitão com o Falcão e sempre achei que Sam deveria ser “apenas” o Bandeiroso, sem as asas de sua persona alada, mas isso não interfere em minha análise e é apenas uma digressão. O que realmente importante é que, uma vez encerradas as sequências de ação, é Sam quem sofre com a inabilidade do roteiro de fazer algo bem costurado na trama para encerrar seu arco. Dessa forma, eis que o personagem ganha seu momento diante das câmeras para discursar longamente aos membros do GRC sobre como o mundo seria mais bonito se os governos ajudassem os necessitados, o que imediatamente os faz mudar toda sua política, claro (se ouviu um barulho agora, foram meus olhos revirando…).

Lógico que eu tinha certeza absoluta de que haveria discurso e o material que Sam leu no teleprompter da Marvel nem estava ruim em si, mas ficou completamente deslocado ali no meio da rua, usando o mesmo artifício das câmeras apontadas para John Walker, mas para mostrar, sem sombra de dúvidas, que aquele sujeito é mesmo o Capitão América dessa vez. Melhor dizendo, não ficou exatamente deslocado, mas sim dolorosamente artificial, mesmo que tenham sido verdades que precisavam ser ditas. Nesse aspecto, o roteiro de Malcolm Spellman e Josef Sawyer foi consideravelmente preguiçoso, pois foi o típico momento em que tudo parou para que frases bonitas saíssem da boca do Capitão que, como em um estalar dedos (he, he, he), fez o mundo ficar melhor. Isso reduz o impacto de toda a luta e de todas as dúvidas de Sam ao longo da minissérie, convertendo tudo em um momento extremamente didático que só faltou ganhar uma apresentação de PowerPoint ao fundo para acompanhar.

“Ah, mas não tinha jeito e tinha que ser assim”, alguns dirão. Novamente, em um mundo em que muitos acham que uma série cumprir sua função a torna espetacular, sim, não tinha mesmo jeito. Em outro mundo, bem melhor do que este, o discurso de Sam poderia ter sido inserido de maneira orgânica em suas ações, sem que ele basicamente precisasse parar, olhar para a câmera e fazer um monólogo memorizado minutos antes. Neste mesmo mundo melhor, inclusive, tudo poderia ser revolvido com mais um ou dois episódios para evitar essa correria ao final ou, simplificando tudo, esse longo discurso até poderia existir como tal, mas ele deveria ser o momento realmente final da série, com um corte imediato para os créditos.

Esta última alternativa provavelmente significaria que o outro epílogo, com Isaiah Bradley recebendo o reconhecimento que merecia, teria que ficar de fora, mas o personagem aceitando, por intermédio do discurso, que Sam é sim o Capitão já curaria essa questão. Seja como for, o momento Sam-Isaiah no museu foi, reconheço, muito bonito e só reforçou minha vontade de ver uma minissérie sobre o primeiro Capitão América negro passada na década de 50, durante a Guerra da Coréia. Será que um dia seremos brindados com isso?

E, com isso, a rápida minissérie Falcão Capitão América e o Soldado Invernal chega a seu fim, um fim correto no final das contas, mas atrapalhado por escolhas estéticas e narrativas altamente questionáveis que deveriam ter sido evitadas, especialmente considerando os dois ótimos episódios anteriores. Seja como for, com o manto devidamente passado, um quarto filme do Capitão América imediatamente anunciado, e com muitas pontas soltas para ajudar a construir a nova fase do UCM, Sam Wilson parece ter um futuro promissor pela frente.

Comentário pós-crítica: O mordomo de Zemo matando os supersoldados (ou fingindo que os matou para que eles sejam recrutados depois pelo patrão, como suspeito) e o próprio Zemo refestelando-se com a notícia em sua cela na Balsa foram dois momentos muitos divertidos de se ver. Marvel, cadê o anúncio dos Thunderbolts, hein?

Falcão e o Soldado Invernal – 1X06: One World, One People (The Falcon and the Winter Soldier – EUA, 23 de abril de 2021)
Criação e showrunner: Malcolm Spellman
Direção: Kari Skogland
Roteiro: Malcolm Spellman, Josef Sawyer
Elenco: Sebastian Stan, Anthony Mackie, Wyatt Russell, Clé Bennett, Danny Ramirez, Carl Lumbly, Erin Kellyman, Desmond Chiam, Dani Deetté, Amy Aquino, Daniel Brühl, Emily VanCamp, Julia Louis-Dreyfus, Carl Lumbly, Elijah Richardson, Gabrielle Byndloss, Georges St-Pierre
Duração: 51 min.

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