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Crítica | Ivan, o Terrível – Parte 2 (1958)

por Guilherme Rodrigues
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A produção da saga de Ivan, O Terrível foi particularmente complicada. Originalmente envisionada como um projeto em três partes, a reação dos órgãos de censura soviéticos a segunda parte foi tão negativa que foi tomada a decisão de não lançá-lo, e a terceira parte, que estava começando a produção, foi encerrada. Sergei Einsenstein morreu quatro anos após o lançamento da primeira parte, em 1948, nunca chegando a ver a segunda parte ser lançada no cinema, o que só ocorreu 10 anos após sua morte, em 1958.

Esse contexto histórico é importante pois Ivan, O Terrível Parte II é, muito evidentemente, um filme de transição dentro da narrativa, um “meio do caminho”, por assim dizer, para a derradeira conclusão que nunca veio a ser. Ao final da parte I, Ivan abdica do trono, avisando que retornaria caso o povo clamasse por tal coisa, afirmando já ter a confiança das massas para reinar, e seu retorno de fato acontece, deixando os planos de outros monarcas em desarranjo . De fato, a presença das massas nessa sequência é bem reduzida, se no primeiro filme ela existia mais para destacar o poder que o Czar tinha sobre elas, aqui elas mal marcam presença, sinal de que elas realmente já foram conquistadas, e o foco é nas relações de Ivan com os membros mais diretos da corte, enquanto explora um aspecto menos idealizado do personagem.

Na parte I, o protagonista era absolutamente infalível com seus planos, vencendo uma guerra praticamente sozinho. A narrativa até mesmo cria paralelos da vida dele com a de Jesus – Ivan chega a “morrer” somente para “ressuscitar” ainda mais forte, é claro –  mas agora Eisenstein está interessado em observar o que torna o mito que ele próprio construiu, um homem como outro qualquer. A começar pela postura com a qual ele é introduzido ao filme. Se a primeira imagem de Ivan antes era altiva, clara, sendo banhado em ouro em sua coroação, agora ele chega às telas como um homem encurvado, vestido de preto e lembrando dos eventos traumáticos da sua vida, em particular o da morte da mãe, que marca também o início de seu conflito com os boiardos, casta da alta cúpula da Rússia feudal que frequentemente teve atritos com a figura do Czar Ivan.

Esse olhar mais humano para o protagonista leva a um ponto importante da trama, que é o retorno de um amigo de infância de Ivan, Kolychev (Andrei Abrikosov) que agora se tornou monge, e adotou o nome de Philip. Esse personagem revela o grande vazio do Czar, que passa a ceder aos pedidos do monge, simplesmente para que ele não perca um dos poucos amigos que tem. Mas esse momento de “fraqueza” não dura muito, e logo ele assume a alcunha de “Terrível” sem nenhum temor, eliminando todos aqueles que se opõem ao seu poder.

O grande destaque do longa fica pelas sequências em cor, nos minutos finais do filme, onde o vermelho impera no cenário, enquanto Ivan arma outra morte. É uma quebra radical do que veio antes, não só pela cor, mas pelo movimento da cena, que é frenético e conta até mesmo com músicas sendo cantadas, mas que representa a derradeira transformação de Ivan em um déspota, algo que permeava o filme até então. Uma pena que nunca veremos uma exploração mais profunda da tirania de Ivan, já que a conclusão dessa história foi perdida.

 Ivan, O Terrível Parte II (Ivan Grozniy) – URSS, 1958
Direção: Sergei Eisenstein
Roteiro: Sergei Eisenstein
Elenco: Nikolay Cherkasov, Serafina Birman, Andrei Abrikosov, Mikhail Zarov, Amvrosy Buchma,  Mikhail Kuznetsov, Lyudmila Tselikovskaya
Duração: 88 min.

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