- Há spoilers. Leiam, aqui, a crítica dos episódios anteriores.
Ah, não, não, não e NÃO. Por todos os deuses antigos e novos, não é possível que tenham feito isso no final da 3ª temporada de Deuses Americanos!!! O que Charles H. Eglee quer, afinal? Que mesmo os mais fieis e resolutos seguidores da série baseada no livro homônimo de Neil Gaiman sequer se importem se ela será renovada para uma 4ª temporada? Que, se houver renovação – o que já começo a duvidar fortemente – ninguém tenha o menor interesse em voltar para saber o que acontecerá com Shadow Moon companhia?
Porque é isso que pareceu em Tears of the Wrath-Bearing Tree, episódio que, considerando a fraca primeira metade da temporada e a esperançosa subida de qualidade na segunda, tinha a obrigação de encerrar muito bem esse terceiro ano da série. Mas não. O que temos, no lugar, é um episódio que é a definição do anticlímax e da necessidade doentia de se criar uma sucessão de cliffhangers sem a menor preocupação em encerrar arcos, em oferecer convergência narrativa significativa ou sequer de empolgar o espectador.
Não consigo dizer com veemência nem que foi bacana ver Shadow Moon seguindo a vontade do pai e sacrificando-se em Yggdrasil, o eixo do mundo na Mitologia Nórdica. Sim, a árvore se beneficia de um CGI que a faz ficar esplendorosa mesmo desfolhada pelos rigores do inverno e sim, é interessante a abordagem onírica do que Shadow passa em seu tormento de nove dias, inclusive a revelação de que tudo não passou de um plano do próprio Odin – o protagonista sequer desconfiar de algo assim mostra o quão pouco ele se desenvolveu na série – para não só ressuscitar, como ressuscitar com força total, já que o sacrifício filial é o mais potente de todos. Toda essa sequência, na verdade, pareceu apenas morna, interessante apenas de maneira perfunctória, pois em momento algum a construção da narrativa consegue estabelecer um senso de tensão ou perigo ou invocar imagens ou sequências – com exceção do twist de Wednesday, claro – realmente memoráveis.
E o pior é que esse clímax, se é que podemos chamá-lo assim, vem depois de uma lenta, cansativa e consideravelmente inútil sequência interminável de representantes dos deuses em território neutro – mais um hotel! – para velar Odin. Mr. World oferecendo paz já cansou assim como o Pai de Todos prometendo guerra e Crispin Glover, antes sinistro, agora parece uma caricatura mal desenhada de seu personagem, um verdadeiro pastiche. Laura Moon, adúltera uma hora, zumbi na outra, amante de Leprechaun em mais outra ainda, frequentadora de Purgatório em seguida e assassina de deuses, finalmente, parece uma barata tonta sem muito o que fazer que não seja arrastar-se por dutos, esconder-se embaixo de mesas, ser traída por Mr. World e poupada por seu ex-marido, com direito a sonho libidinoso com Bilquis – e quem não teria um sonho libidinoso com ela, não é mesmo? – que a leva a outro cliffhanger misterioso com a deusa orixá.
Até mesmo a fuga do Garoto Técnico e sua descoberta do que é o Artefato nº 1, algo sem dúvida interessante por representar a inovação humana, o que dá outra dimensão ao personagem mesmo que não explique como ele “pulou” de humano para deus, pareceu anticlimática, com uma direção não mais do que burocrática de Russell Fine que não faz mais do que depender das caras e bocas de Bruce Langley para conseguir alguma emoção, mesmo que não seja a emoção minimamente desejada pelo espectador. A incapacidade de o roteiro oferecer algum tipo de fechamento mesmo nessa subtrama é algo que diz muito da posição de Eglee a frente da temporada, já que ele basicamente decidiu empurrar tudo para o próximo ano e sequer se deu ao trabalho de justificar todo o foco em Salim em The Rapture of Burning, já que o personagem simplesmente desapareceu depois de ganhar os holofotes.
Resumindo a ópera, Tears of the Wrath-Bearing Tree, episódio de título pomposo, mas vazio, é um cansativo, desnecessário e frustrante dénouement que simplesmente não precisava existir para além de deixar Shadow pendurado em Yggdrasil, o que poderia ter sido feito muito facilmente em The Lake Effect que, agora está claro, deveria ter sido o verdadeiro encerramento da temporada. Não sei se American Gods será renovada e certamente não vou gastar rezas e sacrifícios a deuses tornados desinteressantes para que isso aconteça…
American Gods – 3X10: Tears of the Wrath-Bearing Tree (EUA, 21 de março de 2021)
Showrunner: Charles H. Eglee
Direção: Russell Fine
Roteiro: Laura Pusey, Ryan Spencer
Elenco: Ricky Whittle, Ian McShane, Emily Browning, Yetide Badaki, Bruce Langley, Omid Abtahi, Ashley Reyes, Eric Johnson, Julia Sweeney, Lela Loren, Andi Hubick, Cloris Leachman, Erika Kaar, Denis O’Hare, Herizen F. Guardiola, Devery Jacobs, Iwan Rheon, Crispin Glover, Peter Stormare
Duração: 52 min.