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Crítica | Conto de Areia

por Luiz Santiago
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Muita gente conhece o nome de Jim Henson por conta de sua criação mais popular, Os Muppets, e também o nome de Jerry Juhl por estar ligado a este Universo dos fantoches e ter trabalhado com Henson por muitos anos. O que pouca gente sabe é que a dupla escreveu e revisou por diversas vezes um roteiro para um longa-metragem chamado Tale of Sand. Henson teve a ideia para esse filme em meados dos anos 1950 e até o final da década seguinte esteve em um curioso processo de criação, juntamente com Juhl, construindo uma história onde Mac, o protagonista, está envolvido numa corrida pelo deserto, sendo perseguido por “Patch” um misterioso homem com um tapa-olho.

Em 2011, a editora americana Archaia lançou esse projeto em forma de quadrinhos, contratando Ramón K. Pérez para transpor para a arte visual o roteiro escrito por Henson e Juhl muitos anos antes. E aqui temos um trio que trabalha de modo absurdamente belo na transposição do material escrito para o visual: Pérez, nos desenhos; Ian Herring, nas cores e Deron Bennett, nas letras.

O leitor deve entender desde o início que o caráter dessa obra (ou seja, a adaptação visual de um roteiro de cinema) propõe um modo diferente de experimentar a leitura, assim como deixa claro que não se trata de uma aventura literariamente profunda, com um roteiro tão cheio de nuances que é preciso ler mais de uma vez para poder avançar para a próxima página. Nada disso — até porque o volume tem poucos diálogos. Pérez entende perfeitamente o tipo de material que tem em mãos e prioriza o visual das mais diversas formas, utilizado um bom número de onomatopeias para marcar essa jornada de Mac pelo deserto, fugindo dos mais diversos perigos.

O mais legal desse quadrinho é que ele pode significar um milhão de coisas diferentes, dependendo do leitor. Uma das minhas leituras, por exemplo, é que essa história representa o ciclo da nossa vida. Chegamos a um lugar onde todos estão em festa por nossa causa, recebemos algumas bugigangas que devem nos ajudar ao longo dos anos de nossa existência e corremos o tempo inteiro de alguma coisa, de algo que tem influência e recursos o suficiente para colocar obstáculos em nosso caminho. Obstáculos que nos deixam mais fortes, nos fazem crescer. Até que acreditamos que a jornada terminou (a morte). Mas então esse ciclo começa mais uma vez (o novo nascimento, a nova fuga).

Essa visão, porém, não me prende a nenhuma batida de martelo em relação à trama. Numa saga surrealista como essas, o aproveitamento da jornada visual é a melhor coisa que a gente pode fazer. E mesmo que um sentido ou outro possa se formar para esse enredo, em nossas mentes, o bom mesmo é olharmos para o produto como se ele não tivesse um significado. Ele é “apenas” um processo de criação de muitas coisas, onde a escolha aplaudível de cores, os detalhes ou a ausência deles nos desenhos e o trabalho “visualmente-literal” que os artistas imprimiram à obra, explorando visualmente as páginas de um roteiro, fazem toda a diferença na construção da nossa experiência como leitor.

Não gostei muito das voltas repetitivas que temos no final, quando Mac entra e sai de um saloon, mas ainda aí temos inserções muito criativas dos perseguidores nos quadros (ou fora deles) e também da ideia de movimento desses indivíduos, que para mim é a menina dos olhos desse Conto de Areia. Uma história sobre percorrer um trajeto cheio de perigos e empecilhos, vencer todos eles e ter que estar pronto para uma trajetória semelhante. Um visual e marcante espelho para a dinâmica da vida.

Conto de Areia (Tale of Sand) — EUA, 2011
Roteiro: Jim Henson, Jerry Juhl
Arte: Ramón K. Pérez
Cores: Ian Herring
Letras: Deron Bennett
Editora original: Archaia Entertainment
No Brasil: Pipoca & Nanquim, 2018
160 páginas

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