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Crítica | Star Trek: Discovery – 3X04: Forget Me Not

por Ritter Fan
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  • Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios da série e, aqui, de todo nosso material sobre Star Trek.

Star Trek: Discovery vem desbravando seu próprio e peculiar caminho desde a 1ª temporada, o que, claro, irrita muito fã da franquia que espera ver o que já foi feito repetidas vezes antes. Mas é interessante ver que, mesmo nessa direção diferente, a primeira série do que pode ser chamado de revival televisivo de Star Trek bebe inteligentemente do legado, como por exemplo ao trazer o Capitão Pike e o próprio Spock no segundo ano e volta e meia remexendo nas mais diferentes referências ao passado da criação de Gene Roddenberry. Forget Me Not é o mais recente retorno à atmosfera clássica, com um roteiro de viés psicológico tanto da trama principal quanto na paralela, privilegiando contemplação e diálogos no lugar de ação e triunfando nessa escolha e em sua execução.

A recém-introduzida Adira, hospedeira humana do simbionte Tal, é o foco das atenções. Sem memória ou contato com seu simbionte, ela potencialmente guarda segredos importantes sobre o destino da Federação. Para tentar destravá-la, a Discovery viaja até Trill, planeta natal dos simbiontes, onde são muito bem recebidos por seus líderes até que eles rapidamente se dividem ao descobrir que Adira é humana, em uma fusão aparentemente impossível e sem precedentes. O Comissário Vos (Andrew Shaver) quer extrair o simbionte mesmo que isso signifique a morte de Adira, ao passo que o Guardião Xi (Andreas Apergis) deseja levá-la às sagradas Cavernas Mak’ala para tentar completar a conexão de Tal com Adira, o que, claro também traz riscos. Salomonicamente, porém, a Líder Pav (Karen Robinson), reconhecendo o que chama de abominação, mas não querendo arriscar a vida da hospedeira, manda-a embora juntamente com Michael.

O que se tem, portanto, é um clássico conflito de Star Trek, um que já vimos antes tantas vezes e cujo desfecho mais ou menos conhecemos. Não há, portanto, grandes surpresas quando Xi acaba levando Adira e Michael até as cavernas, que são o habitat natural dos simbiontes, para que o mergulho em uma da piscinas de líquido de aparência leitosa possa reativar as memórias de Tal, o que, claro, é a oportunidade perfeita para que aprendamos mais tanto sobre o simbionte quanto Adira, em flashbacks que explicam seu relacionamento amoroso com Gray Tal (Ian Alexander), o acidente que o coloca em estado crítico e a transferência de Tal para Adira. Tudo é feito de maneira muito simples e objetiva, com a interferência e ajuda de Michael, claro, que não hesita em ajudar quando o processo começa a dar errado, mesmo que sob a mira dos Trills enraivecidos pela traição de Xi.

E, com isso, quase que instantaneamente, a temporada ganha dois personagens fascinantes. A jovem Adira, agora integralmente fundida com o simbionte Tal e funcionando como guia para a Discovery encontrar o que restou da Federação, e Gray, seu amor, surgindo ao seu lado como a Número 6 se “materializa” para Baltar em Battlestar Galactica, em uma relação que tem grande potencial se os episódios seguintes decidirem aproveitá-la e não descartar os personagens como Book foi sem cerimônia no capítulo passado. Em meio a isso tudo, ainda ganhamos vislumbres dos hospedeiros anteriores, inclusive e especialmente o almirante Senna Tal (Kenneth Welsh), em um breve momento de emoção.

Mas mais emocionante e ainda mais startrekiano foi a sub-trama lidando com Saru e outra cura, desta vez de sua própria tripulação de um mal coletivo: stress mental e trauma de uma sensação de vazio causada pelo salto temporal de quase mil anos. Para todos os efeitos, o que vemos é uma bela e muito relevante metáfora sobre a importância da saúde mental no ambiente de trabalho que, assim como a história principal, é muito bem conduzida pela direção de Hanelle M. Culpepper que valoriza cada personagem na medida em que Saru conduz um jantar procurando a harmonia entre seus colegas mais próximos e obtendo exatamente o contrário, mas um contrário catártico que leva ao reconhecimento de que o problema existe e, ato contínuo, o início do processo de cura.

Devo dizer que não esperava uma abordagem tão elegante e tão bem pensada para uma situação como essa. Na verdade, sequer esperava que a saúde mental da tripulação fosse objeto de metade de um episódio da série e que algo assim resultasse em uma narrativa absolutamente fascinante. Não só Saru se consolida como um grande capitão, como todos que se sentaram à mesa, notadamente Staments, Tilly e Detmer – com o alívio cômico de Georgiou, lógico – ganham excelente desenvolvimentos. Aliás, é refrescante notar que os problemas de Detmer parecem ser exclusivamente de fundo psicológico e não algo relacionado com Controle e que a Esfera, aparentemente, assim como Tal e Adira, fundiu-se à nave, inclusive sugerindo um cineminha para todos com o grande Buster Keaton em uma cena primorosa, de um incrível bom gosto e importância para aquele sentimento de comunidade.

Mas a cereja no bolo dessas duas ótimas histórias foi a forma como elas forma conectadas pela narração e interferência de Hugh Culber, em uma ótima atuação de Wilson Cruz como o guardião da saúde de todos ali. Não só ele sugere como curar Adira, como faz com que Michael a acompanhe até o planeta, tudo isso enquanto consegue diagnosticar o problema psicológico que vem afetando a tripulação da Discovery, induzindo Saru a tomar as medidas que acaba tomando.

Forget Me Not é um episódio incomum para Discovery que não exatamente serve para impulsionar enfurecidamente a história macro, mas que traz uma deliciosa sensação de paz, de realização e de comunidade. É Star Trek raiz repaginada para o século XXI e para a dinâmica da nova série com um resultado realmente extraordinário.

Star Trek: Discovery – 3X04: Forget Me Not (EUA, 05 de novembro de 2020)
Showrunners: Alex Kurtzman, Michelle Paradise
Direção: Hanelle M. Culpepper
Roteiro: Alan McElroy, Chris Silvestri, Anthony Maranville
Elenco: Sonequa Martin-Green, Doug Jones, Anthony Rapp, Mary Wiseman, David Ajala, Wilson Cruz, Rachael Ancheril, Michelle Yeoh, Tig Notaro, Emily Coutts, Blu del Barrio, Ian Alexander, Andrew Shaver, Andreas Apergis, Karen Robinson, Kenneth Welsh
Duração: 55 min.

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