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Crítica | Morcegos (1999)

Um divertido e formulaico horror ecológico com morcegos.

por Leonardo Campos
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Desde o seu lançamento em 1999, Morcegos não ganhou um exemplar do mesmo nível. Não que a narrativa seja um primor do gênero horror ecológico, ao contrário, é cheia de inconsistências e falhas, mas é preciso reconhecer que a estrutura amarrada nas bases do clássico moderno Tubarão, bem como a presença de um elenco acima da média e de uma história divertida e suportável como entretenimento não foram prerrogativas dos posteriores Ataques de Morcegos, Reféns da Noite, Morcegos – Colheita Humana e Morcegos – Assassinos da Noite. E, desde os anos 1970, não se via os únicos mamíferos voadores como antagonistas como centro nervoso da história a ser contada. Várias vezes, tais criaturas da noite marcaram presença em filmes de vampiros ou em qualquer trama sobre a passagem de personagens por uma caverna, ou então, envolvida em algo sombrio e diabólico. Tal como os pássaros, os morcegos não tiveram uma carreira de longo sucesso na indústria do cinema, tendo apenas participações bem pontuais, algo que não ocorreu com os tubarões, os crocodilos, as serpentes, os ursos, dentre outros animais. Único mamífero capaz de voar, os morcegos estão ligados ao noturno e ao sombrio, muitas vezes ao inexplicável. Atravessam a escuridão cotidianamente, alegoria para a sabedoria, aprendizagem.

Sob a direção de Louis Morneau, cineasta que teve como direcionamento, o roteiro escrito por John Logan, acompanhamos uma empolgante narrativa de 91 minutos sobre o interesse das forças armadas em detonar uma cidade inteira, tornando-a pó. O leitor deve se perguntar: o que isso tem a ver com os morcegos, criaturas conhecidas por beber o sangue de outros animais? Já respondo: na tal cidade, Gallup, no Texas, uma experiência científica não dá certo e o resultado é a transformação destas figuras noturnas em monstros aberrantes, loucamente irritados com as manipulações genéticas e com algo muito além do apetite voraz. Eles tiveram mecanismos modificados em suas estruturas interiores e tornaram-se, digamos, “inteligentes”, algo semelhante aos tubarões do frenético Do Fundo do Mar, lançado no mesmo ano. Para resolução do problema, temos a zoóloga Sheila Casper (Dina Meyer), especialista que trabalhará junto ao seu assistente Jimmy (Leon). Com ajuda do xerife Emmett Kimsey (Lou Diamond Phillips), eles litam pata resolver a crise antes que seja tarde demais. A sociedade civil e o poder, no entanto, dificultam tudo, haja vista a cartilha básica do horror ecológico. Ninguém quer acreditar na ameaça.

Como sabemos, será preciso ver para crer. E o que será apresentado não é nada agradável. A ferocidade dos morcegos é absurda e as suas estratégias de ataque cada vez mais astutas. É por isso que, tal como mencionado no parágrafo anterior, as forças armadas querem detonar a cidade, afinal, os experimentos possuem conexões secretas, motivo a mais para colocar fogo em tudo que for comprometedor enquanto registro documental. O Dr. Alexander McCabe (Bob Guton) faz a linha do cientista maluco aqui, sem muito poder de convencimento. É um personagem fraco, sem o perfil esférico que esperamos para teme-lo. Ele sucumbe a todos os estereótipos possíveis, mas a sorte é que possui pouca importância no desdobramento da ação. A dupla zoóloga e xerife, milagrosamente, não adere ao clichê do desejo sexual pulsante, responsável por promover tórridas cenas de amor nos filmes deste segmento. Profissionais e dedicados, eles acreditam que o problema maior é a incidência cada vez mais violenta e incontrolável dos morcegos. Enquanto a situação não é controlada, a pilha de corpos cresce cada vez mais.

Lançado numa era de popularização dos efeitos visuais, reconfigurados com os novos padrões de softwares e possibilidades de manipulação da imagem na cultura virtual, Morcegos convence na seara da visualidade. Há um tom realista nas cenas com as criaturas em pleno ataque, os efeitos especiais conseguem dar maior valor aos retoques computadorizados, num efeito de transformação destas criaturas já sombrias em monstros aterrorizantes e ameaçadores. A cena da mina, por exemplo, é realista e agonizante. Tais criaturas são pomposos monstros que acionam o nosso imaginário desde as representações cristãs destas criaturas na história da arte, quando ganharam associação com os demônios bíblicos que também tinham asas. Agressivos, dormem de cabeça para baixo, algumas espécies, como a apresentada pelo filme, isto é, o morcego-vampiro, tem na alimentação o sangue como predileção, além de toda a sua construção cultural voltada ao noturno, associação que o transformou, desde a Idade Média, numa criatura perigosa e sombria.

Todo esse background é acionado pela direção de fotografia de George Mooradian, setor que investe de maneira eficiente na abertura e fechamento dos planos, seja para diminuir ou aumentar a tensão de certas passagens, reforçadas em seu clima de horror pela trilha sonora de Graeme Revell, textura percussiva não muito surpreendente, mas adequada para a proposta do filme. O design de som ajuda no alavancar dos aspectos audíveis de Morcegos, transformando a agonia da presença destas criaturas em algo além da música extra-diegética. Os cenários e a direção de arte, parte integrante do design de produção assinado por Phillip Duffin, compõem os espaços do laboratório, das salas e quartos domésticos e dos demais ambientes comerciais da cidade, num bom trabalho situacional. Os efeitos visuais gerenciados pela equipe de Laurel Klick também fazem bem a sua parte, dando ao filme sobre ataque de morcegos o material necessário para a narrativa avançar: morcegos convincentes, mesmo que exagerados no tamanho, para compor o clima de ameaça de humanos diante do ataque de criaturas que chupam e absorvem o sangue de outras. Neste caso, a absorção e a ameaça não são apenas dedicadas aos animais selvagens, mas inclui seres humanos na lista de presas em potencial.

Sabemos que tudo no final pode dar certo, talvez sobre um morcego geneticamente modificado para garantir a continuação desnecessária, mas quem se importa, não é mesmo? É a indústria e já sabemos como tudo funciona. Os morcegos, símbolos da ventura e da felicidade, da ideia de morte (para os mexicanos), sagrado (para os africanos ocidentais), parte integrante da dieta em algumas regiões asiáticas, mesmo que seja um costume que tenha caído em desuso nos últimos anos, neste filme hollywoodiano, ganharam a alcunha de predadores assassinos. No cinema, ao menos nos circuitos das salas de cinema e nos lançamentos oficiais em VHS, DVD e afins, os morcegos não apareciam em narrativas ficcionais com pompa desde Terrores da Noite, tradução intersemiótica do romance de Martin Cruz Smith. É, mais ou menos desta época, Morcegos Humanos, também conhecido por The Bat People, lançado em 1974, narrativa de horror sobre um médico que é mordido por um morcego numa caverna e passa por uma transformação acelerada ao misto de homem e mamífero voador, espalhando medo e pavor em sua cidade. No mesmo ano, Chosen Survivors investiu em indivíduos num espaço subterrâneo, em busca de proteção para um ataque nuclear, mas que precisam lutar não apenas contra a situação bélica, mas enfrentar uma colônia de morcegos-vampiros insaciáveis.

Morcegos — (Bats– Estados Unidos, 1999)
Direção: Louis Morneau
Roteiro: John Logan
Elenco: Lou Diamond Phillips, Dina Meyer, Bob Guton, Leon, Carlos Jacott, David McConnell, Marcia Dangerfield, Oscar Rowland
Duração: 91 min.

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