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Crítica | 3% – 3ª Temporada

por Fernando Annunziata
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Vou pra rua e bebo a tempestade.

É difícil discutir uma obra que retoma questões marcantes e sequências inspirativas, que outrora deu certo. No caso de 3%, a 3ª Temporada é uma releitura direta da primeira, levantando os mesmos assuntos discutidos sob uma mesma filosofia e ambiente. Esse artifício funciona: relembra o teor chocante da 1ª Temporada, que conseguiu atrair muitas críticas positivas. Por outro lado, realça a questão: repetir assuntos já vistos é uma artimanha eficiente para manter a audiência fiel conquistada anteriormente ou é o reflexo da covardia dos produtores?

De fato, a 1ª Temporada dividiu muito as críticas. O fato, é que indiscutivelmente, 3% surge como uma categoria pouco vista por aqui: a crítica como elemento secundário e imaginário. E talvez esse seja o maior fator para a explosão de audiência que a temporada levou. Uma história que discute meritocracia e desigualdade social sem o semblante que narrativas do gênero carregam, especialmente no Brasil — que tende sempre a lembrar o espectador de que ele “está assistindo a um projeto que quer alfinetar alguém ou alguma coisa” — , era algo um tanto inovador. E isso já foi bastante para projetar 3% tanto nacionalmente quanto internacionalmente. No entanto, apesar da 2ª Temporada turbulenta que desenvolveu aspectos importantes, a série perdeu grande parte do público. A decisão dos produtores não foi diferente de: “então vamos retomar para a primeira temporada?

Claramente retornar com a questão do processo para o Maralto, assunto já discutido antes, seria o mesmo que tratar o espectador como um acéfalo. Felizmente – ou infelizmente -, os roteiristas construíram uma nova maneira de recontar a história. A Concha, fundada por Michele (Bianca Comparato) não é nada mais do que a reconstrução ideológica da estrutura do processo. Tanto que não é um acontecimento mirabolante para que ela propusesse um processo dentro da Concha: bastou uma tempestade de areia aleatória que surgiu literalmente do nada. Se analisarmos a circunstância que desencadeou a história, não está longe de questionarmos o seguinte: “é sério que ergueram uma super construção no meio do deserto mas não tinham um plano de defesa contra tempestades de areia?” De novo, não indo muito distante, percebemos que foi só uma desculpa mal pensada pelos produtores para o início da história. O problema é que os roteiristas tratam, nesse momento, os protagonistas como burros – até porque eles tinham sistema de monitoramento 24 horas, e só perceberam a tempestade quando ela já havia chegado – e, inevitavelmente, tentam brincar com a falta de inteligência dos espectadores.  Não é preciso dizer que isso não dá certo, além de nos deixar extremamente incomodados com tamanha cara de pau, certo?

Depois deste catastrófico primeiro episódio, a série enfim reforça seus pontos positivos. As provas desenvolvidas por Michele são criativas e instigantes; os personagens tem personalidade e boas atuações; as ambientações são incríveis e, pelo menos um elemento diferente da 1ª Temporada: não conseguimos definir para qual lado torcer, se para os eliminados do processo da Concha ou para a Concha. Além disso, destaco a belíssima sequência de Bom Conselho, interpretada por Johnny Hooker, com uma fotografia literalmente impecável, fazendo qualquer um terminar em lágrimas. Pena que, ironicamente, essa sequência é bem parecida com Preciso Me Encontrar, cantada na temporada anterior – está complicado encontrar algo diferente aqui.

Porém, não é difícil percebermos que a Concha é uma reprodução do Maralto, que Michele tem a mesma função que Marcela (Laila Garin) e Ezequiel (João Miguel), que Xavier (Fernando Rubro) repete a personalidade e tem o mesmo papel de Fernando (Michel Gomes), que Glória (Cynthia Senek) tenta substituir o papel de Joana (Vaneza Oliveira), que, por sua vez, se torna a releitura de Ivana (Roberta Calza), entre outros. Isso até funciona e prende o espectador durante todos os episódios. É, de fato, uma “fórmula de sucesso”. Mas até quando os produtores se esconderão no manto da primeira temporada, sem desenvolver a história? Note que literalmente não acontece nada de muito marcante nesta temporada, bastava uma citada em um único episódio para resumir tudo que aconteceu aqui. Sem dúvidas, isso é consequência da releitura do primeiro ano, pois se estamos vendo o que já aconteceu, não há nada de novo. É, resumidamente, um passatempo para enrolar a vivência da série. Pelo menos o final levanta um clima positivo. Poderemos esperar uma 4ª Temporada bem badalada, com um hype maior do que a 2ª. Se essa esperança de recuperar as expectativas foi o objetivo dos produtores, eles conseguiram.

A 3ª Temporada de 3% é interessante de se assistir. Pena que é a repetição de tudo que já vimos antes, em especial a estreia, tornando-se uma temporada inútil do ponto de vista execução da história, mas cativante nas sequências. O que podemos esperar é uma maior ousadia dos produtores (que mostraram interesse em ter, visto o final do presente ano) e assim, uma próxima temporada tão boa e interessante quanto a iniciais. De mais, 3% ainda pode ser considerada uma grande produção brasileira.

3% – 3 Temporada (Brasil, 2019)
Direção: Jotagá Crema, Daina Giannecchini, Dani Libardi, Philippe Barcinski, César Charlone
Roteiro: Pedro Aguilera, Ivan Nakamura, Denis Nielsen, Guilherme Freitas, Teodoro Poppovic, Juliana Rojas, André Sirangelo, Jotagá Crema, Cássio Koshikumo, Andrea Midori, Marcelo Montenegro, Carol Rodrigues
Elenco: Bianca Comparato, Vaneza Oliveira, Rodolfo Valente, Zezé Motta, Fátima Porphirio, Rafael Lozano, João Miguel, Michel Gomes, Cynthia Senek, Bruno Fagundes, Laila Garin, Thais Lago, Fernanda Vasconcellos, Silvio Guindane, Celso Frateschi, Mel Fronckowiak, Luciana Paes, Amanda Magalhães
Duração: 8 episódios com cerca de 45 min.

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