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Lista | Manoel de Oliveira – Os Filmes Ranqueados

por Luiz Santiago
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O cineasta Manoel Candido Pinto de Oliveira nasceu na cidade do Porto, em Portugal, no dia 11 de dezembro de 1908 e faleceu na mesma cidade, em 2 de abril de 2015. Ao longo de seus 84 anos de carreira, ele construiu um cinema bastante particular, com características sempre reconhecíveis: câmera majoritariamente parada, uso do máximo de elementos possíveis de um quadro como um canal para enriquecer as cenas (e a história, como um todo, através de símbolos) e exigência de um modelo dramatúrgico bastante teatral de seu elenco. Religião, família, filosofia, feminilidades e literatura foram temas recorrentes em sua jornada cinematográfica.

Nesta lista, trago a maioria dos filmes dirigidos por ele (infelizmente não conseguimos localizar todos para ver e criticar) ranqueados do pior para o melhor, claro, segundo a minha opinião. Nos comentários, você tem a liberdade de fazer a sua própria lista e dizer quais filmes do diretor mais te agradam e quais os que menos te agradam. Não deixe de comentar!

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38º Lugar: As Pinturas do Meu Irmão Júlio

1965

Com narração inicial e breve aparição de José RégioAs Pinturas do Meu Irmão Júlio é o tipo de filme sobre arte que normalmente vai dividir opiniões, e isso acontece pela forma como o objeto artístico está representado pelo cinema, ou seja, qual é o olhar do diretor para a artes plásticas. Qual a proposta do filme para fazer da grande tela uma galeria reflexiva? O artista da vez é Júlio Maria dos Reis Pereira (que como poeta assinava Saúl Dias), irmão do escritor José Régio.

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37º Lugar: Sempre Bela

2006

Em 2006, o diretor português Manoel de Oliveira quis fazer uma homenagem a Buñuel e a Jean-Claude Carrière, voltando a trabalhar com Henri Husson (Michel Piccoli) e Séverine Serizy (Catherine Deneuve), os personagens intensos de A Bela da Tarde. Infelizmente Deneuve recusou-se a retornar para o papel, então coube ao diretor procurar uma triz que representasse Séverine depois de tantos anos, tarefa difícil assumida por Bulle Ogier, que já havia trabalhado com Oliveira em O Meu Caso. Considerando tudo, Ogier consegue nos trazer ótimas nuances de uma personagem que depois de quase 40 anos reencontra-se com um dos motivos de sua perversão quando jovem. Mas pelo caráter de homenagem e pela imensa força de A Bela da Tarde, a cobrança paira no ar e a ausência de Deneuve é sentida em cada segundo do filme.

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36º Lugar: O Pintor e a Cidade

1956

Depois de dirigir o seu primeiro longa-metragem, o excelente Aniki Bóbó (1942), Manoel de Oliveira demorou 14 anos para voltar a assinar um filme. Seu retorno se deu justamente neste curta O Pintor e a Cidade, mais um exercício de exploração do espaço urbano, só que desta vez, pelo olhar de um pintor, vivido por António Cruz. O modelo de exposição da cidade como um grande ser vivo e a representação de suas formas, às vezes difusas, através das aquarelas do pintor, são a grande atração da primeira parte do documentário, que é excelente.

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35º Lugar: A Caça

1964

Manoel de Oliveira já tinha tido problemas com a censura de Salazar por ocasião de seu filme Acto da Primavera (1963), então não foi novidade para ele quando recebeu a ordem de que deveria alterar o final de seu curta-metragem A Caça (1964), criando uma situação feliz para uma tragédia que era, em muitas medidas, um olhar do diretor para o que acontecia em seu país naquele momento. Só em 1988 ele conseguiu relançar o filme com o final que originalmente tinha pensado. O horror do abandono do próximo em tempos de conflitos e necessidades sociais é a grande questão aqui.

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34º Lugar: Cristóvão Colombo – O Enigma

2007

Manoel de Oliveira foi um diretor muito perspicaz ao trabalhar com adaptações. Sua captura de essência das obras originais (como no presente caso, o livro Cristóvão Colon era Português, de Manuel da Silva e Sílvia da Silva) ligava-se constantemente a assuntos de interesse direto do cineasta, que ganhava maior ou igual atenção na adaptação, um casamento que por mais problemas que tenha em sua construção, ainda assim não deixa de nos encantar.

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33º Lugar: O Dia do Desespero

1992

O Dia do Desespero foi inteiramente filmado na casa de Castelo Branco, em São Miguel de Seide, e toda a necessidade de cuidado com a mobília se faz ver na forma simples adotada pelo diretor, utilizando poucos atores e movimentos mais limitados dentro da casa, ora exposta como museu, ora como espaço para a dramatização de uma vida. A força poética das imagens e do lento ritmo da fita nos ajudam a refletir sobre as questões que atormentavam o protagonista. Transitando entre um tipo de documentário e a já famosa direção teatral de Oliveira, a película evoca com muita precisão o sentimento de desespero do qual fala o título, culminando no fatídico dia em que o “biografado” se suicidou.

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32º Lugar: O Pão

1959

Manoel de Oliveira está em um patamar muito específico na história do cinema, um autor capaz de passear entre os trabalhos independentes, publicitários ou institucionais sem perder sua identidade. Como de costume na carreira do diretor, este documentário foi uma encomenda feita pela Federação Nacional dos Industriais de Moagem, que solicitaram ao cineasta um registro da produção portuguesa de pães. Este tipo de ordenação costuma dar amarras ao artista, que deve limitar-se aos pedidos de seu mecenas. No entanto, esse média-metragem não perde em nada para os curtas anteriores de Manoel, que esmiúçam a vida urbana com ênfase na experimentalidade de suas imagens.

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31º Lugar: Douro, Faina Fluvial

1931

Primeiro filme dirigido por Manoel de Oliveira, Douro, Faina Fluvial é um documentário experimental que guarda uma série de semelhanças com os curtas da época, que, de uma maneira inovadora, mostravam o cotidiano de uma cidade: as pessoas trabalhando, as aventuras e desventuras do homem comum, num lugar comum.

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30º Lugar: Um Século de Energia

2015

Existe um quê de memória histórica e familiar nesse filme que é difícil colocar em palavras. As diferentes formas de energia se unem aqui de uma maneira insperada e com um resultado também inesperado. O curta é bem mais do que uma oposição de região de represa mostrada com um espaço de 83 anos entre elas. Claro que isso também acontece e, sim, é algo muito interessante de se ver, mas Um Século de Energia vai além dessa exposição. O diretor consegue passar uma mensagem de pertencimento sem ter uma única palavra falada. Apenas a dança, a música e imagens de um antigo curta-metragem. Uma despedida poética e fortemente ligado ao seu espaço natural. Após o fade final, lemos a seguinte frase: “Manoel de Oliveira deixou-nos durante o processo de pós-produção deste filme, dia 2 de abril de 2015, sem ter visto o resultado final de seu último trabalho“.

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29º Lugar: Vou Para Casa

2001

Um tragédia sobre a vida. Esta poderia ser uma definição curta sobre Vou Para Casa (Je Rentre à la Maison), filme de Manoel de Oliveira lançado em 2001. Mas há mais coisas por trás dessa simples definição. Tendo 92 anos de idade quando o filme chegou aos cinemas, o diretor não fazia segredo em relação ao caráter testamental que o impulsionava naquele momento, às vezes de maneira inconsciente, levando-o para filmes que davam conta do legado de uma vida, dos laços feitos no decorrer de uma carreira, das ideias defendidas, do amor à profissão, aos familiares e a uma rotina que, para todos os efeitos, poderia acabar a qualquer momento.

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28º Lugar: A Caixa

1994

A década de noventa trouxe um frescor à carreira de Manoel de Oliveira, diretor português que já estava no panteão do cinema tanto de seu país quanto do mundo. De 1990 até 2000, o cineasta passou a dirigir um filme por ano, aumentando sua produção de forma absurda, considerando seus oito longas gravados desde 1942. Com a idade já avançada (e Visita ou Memórias e Confissões, seu filme póstumo, já gravado desde os anos 80), Manoel foi capaz de pousar seu olhar crepuscular sob o cinema, e produzir algumas de suas mais belas obras, incluindo A Caixa (1994), que por vezes é considerado um filme menor.

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27º Lugar: Viagem ao Princípio do Mundo

1997

Tenho problemas com o ritmo da obra em toda a primeira parte e não sou particularmente fã do único modelo utilizado no trajeto de carro — com os amigos conversando, sempre no mesmo plano e sempre com a mesma troca para contrapor um interlocutor. Todavia, estes são pontos que, a despeito de trazerem problemas, não interferem de maneira colossal na qualidade da fita. Viagem ao Princípio do Mundo é um bom filme sobre vivências e sobre o quê, de tudo o que experimentamos na vida, permanecem em nós, até a nossa morte.

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26º Lugar: Porto da Minha Infância

2001

Porto da Minha Infância, como o título precede, é um filme construído a partir da pessoalidade para montar um olhar sobre a cidade de Porto. Trabalho que muito nos lembra seus primeiros documentários, como Douro, Fauna Fluvial (1931), uma tentativa de experimentar as noções de imagem da metrópole que surgia em Porto, ou até mesmo trabalhos mais tradicionais como Famalicão (1941) ou O Pintor e a Cidade (1956).

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25º Lugar: Os Canibais

1988

Se o espectador chega a Os Canibais sem saber absolutamente nada sobre o filme, o choque diante do que será apresentado é definitivamente garantido. Também baseado em uma novela de Álvaro Carvalhal, Os Canibais é uma ópera criada especialmente para o cinema. João Paes, que escreveu o libretto, propôs o desafio a Manoel Oliveira, que vinha de um outro experimento cinematográfico (O Meu Caso), e parecia querer explorar todas as possibilidades visuais, narrativas e também musicais que o cinema lhe permitisse.

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24º Lugar: ‘Non’, ou A Vã Glória de Mandar

1990

Para os meus netos“, diz a dedicatória de Manoel de Oliveira logo nos créditos iniciais de ‘Non’, ou A Vã Glória de Mandar, drama histórico com aparências de documentário (e sequência musical, operística) sobre a História de guerras, engenhos, conquistas e principalmente derrotas de Portugal. Em muitos sentidos, trata-se de uma anti-epopeia sobre as raízes culturais, de fundação nacional e sobre uma parte da identidade do país, diante das quais o diretor olha de maneira crítica e historicamente coerente, mantendo, inclusive, o tom ultrapassado de certas conclusões historiográficas e sociológicas que ouvimos da boca do Alferes Cabrita (um solene e emotivo Luís Miguel Cintra) e também de seus amigos soldados. A mentalidade bélica e o ideal geral de motivações para as conquistas de Portugal ao longo da História são vistas aqui sob um olhar assumidamente conquistador e, dentro dessa mesma perspectiva, lírico, trágico e engajador.

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23º Lugar: O Quinto Império – Ontem Como Hoje

2004

O Quinto Império – Ontem Como Hoje é um filme especial na filmografia de Manoel de Oliveiradiante de tanta proximidade com outras obras do diretor. Fruto do texto teatral El Rei Sebastião de José Régio (autor fortemente ligado à filmografia de Oliveira), Quinto Império é uma descida íngreme diante da queda de um jovem rei fanático e ambicioso prestes a entrar em batalha. O monarca aparece em Non ou A Vã Glória de Mandar (1990) e no mais recente Palavra e Utopia(2000) como uma figura intransigente que se torna símbolo dessa decadência corrompida ainda mais explorada nos filmes citados.

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22º Lugar: Party 

1996

Como já dito exaustivamente ao falar-se do cinema de Manoel de Oliveira, os anos 90 foram uma década muito especial e prolífica na carreira do diretor. Party tem pouco destaque entre os outros filmes de Manoel desta época, ainda mais se considerarmos que foi lançado entre os belíssimos O Convento Viagem ao Princípio do Mundo. Mas isso faz o filme ser “menor” que o resto? Talvez em escala, se trata puramente de quatro atores contracenando num espaço reduzido, mas não é esta claustrofobia que fizera Benilde ou A Virgem Mãe uma obra-prima? É claro que o cineasta passou por antologias como Amor de Perdição Non ou A Vã Glória de Mandar, obras que narram histórias épicas dignas de um cinema de Hollywood, mas também em seus trabalhos “menores” é capaz de exercer um estudo do tempo a partir da mise-en-scène daqueles espaços e corpos.

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21º Lugar: Inquietude

1998

Inquietude é um filme improvável, dentre os muitos filmes improváveis dirigidos por Manoel de Oliveira. A película é uma adaptação de três histórias sem conexão alguma e basicamente está marcada pelo discurso sobre o envelhecimento e o legado que alguém pode deixar para o mundo; os caminhos mais absurdos do amor e do grande sonho de uma vida inteira; e sobre o isolamento, a transformação e a diferença de alguém em seu meio cotidiano e social.

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20º Lugar: O Princípio da Incerteza

2002

Segundo a Mecânica Newtoniana, sabendo-se a posição inicial e o momento de todos os corpos de um sistema, é possível calcular suas interações e como eles se comportarão. Já em relação à mecânica quântica, segundo o princípio da incerteza, não podemos determinar precisamente a posição e movimentos de uma partícula. Nem das partículas quânticas, tampouco das personagens de Manoel de Oliveira. De volta à marcante presença de Leonor Silveira, já companheira de muitos filmes, e Leonor Baldaque, também já marcada na filmografia do diretor, Manoel nos agracia com outro de seus jogos de imprevisibilidade burguesa envolvendo grandes personalidades encenadas em seu já conhecido rigor cênico.

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19º Lugar: Visita ou Memórias e Confissões

1993

A autenticidade de Manoel de Oliveira é espantosa. Seu cinema é repleto de camadas familiares, íntimas, sentimentais e históricas, e mais em alguns filmes do que em outros, vemos preocupações e até fixações do diretor em relação a um tema ou a um tipo de pessoa/objeto de estudo ganhar destaque em uma porção de “obras do momento”. Visita ou Memórias e Confissões (1993) é um desses filmes de desabafo em tela. E sua história é bastante curiosa.

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18º Lugar: O Convento

1995

O Convento é uma obra estranheza no clima é nítida. O convento que dá título ao filme carrega uma atmosfera áspera, cheia de vazios e silêncios que entregam ao espectador um enigma, a sugestão de algo por trás muito maior que o que é contado. A história começa conturbada desde a produção do filme, que correu para substituir o protagonista por John Malkovich semanas antes das gravações. A obra nasce maldita, e a maldição plana diante dessa livre adaptação de Fausto encenada pelo brilhante Manoel de Oliveira.

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17º Lugar: Espelho Mágico

2005

Espelho Mágico (2005) é mais uma das lindas e estranhas empreitadas barrocas de Manoel de Oliveira. O filme traz a fé como elemento gerador do argumento central e, a partir dele, o fanatismo encontra lugar e se propaga, gerando situações que beiram o surreal e abraçam a comédia. Inspirado no romance A Alma dos Ricos, de Agustina Bessa-Luís (segunda parte da trilogia O Princípio da Incerteza, composta pelos livros Joia de FamíliaA Alma dos Ricos e Os Espaços em Branco), Espelho Mágico contou com algumas rusgas no processo de produção, com um pequeno desentendimento entre Oliveira e Bessa-Luís, escritora que o cineasta adaptava desde Francisca(1981). Esses problemas foram resolvidos ainda no processe de filmagens e todos estavam relacionados ao tratamento do diretor em relação ao tema da riqueza e da fé.

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16º Lugar: O Estranho Caso de Angélica

2010

Entre uma sonata de Chopin, o canto do lavradores da vinha e cânticos religiosos, O Estranho Caso de Angélica é exemplo de um cinema puro e particular. Talvez traga a oposição entre o velho e o novo mundo (os trabalhadores com as enxadas em oposição às máquinas), talvez seja um desfile de símbolos literários – Antero de Quental, José Régio – talvez seja um desabafo sobre o cansaço de buscar respostas, da falta de um olhar mais profundo do mundo atual para o verdadeiro estado das coisas, mesmo que esse verdadeiro estado seja uma hipótese, a admissão do fantástico, a aceitação de tudo como parte seminal de um grande campo de existências. O filme é como o poema Exausto de Adélia Prado: Quero o que antes da vida / foi o sono profundo das espécies, / a graça de um estado. / Semente. / Muito mais que raízes.

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15º Lugar: O Passado e o Presente

1972

Mesmo que conte com uma premissa simples, porém interessante, O Passado e o Presente tem seu forte nos detalhes carregados de simbolismos dos mais diversos, sendo o antagonismo entre vida e morte o mais evidente e corriqueiro. A atenção e o cuidado de Oliveira em representar essas questões tão pertinentes para nós sempre com a presença de seu par inverso quase que exclusivamente através dos detalhes é fascinante e torna essa obra do português um grande expoente em sua enorme carreira.

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14º Lugar: Palavra e Utopia

2000

Quando dirigiu Palavra e Utopia, em 2000, o cineasta Manoel de Oliveira estava prestes a completar 92 anos de idade, e em diversas entrevistas atestou que este filme era um exercício onde a maturidade encontrava a simplicidade e tentava fazer muito com o mínimo possível. De fato, Palavra e Utopia é um filme que une o caráter da severidade religiosa com uma técnica simples, guiada por planos-sequência, por pouca movimentação de câmera, grande contemplação e muitos, muitos discursos e sermões, o que torna o filme bastante lento (mais lento do que aquilo que normalmente esperamos de Oliveira), comprometendo um bocado a nossa experiência.

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13º Lugar: Um Filme Falado

2003

Um Filme Falado (2003) é uma espécie de continuação — agora com uma abordagem mais teórica e um argumento mais bem definido sobre a civilização — do que o cineasta Manoel de Oliveirafizera em ‘Non’, ou A Vã Glória de Mandar (1990), ou seja, uma visão histórica que não se ressente de seu caráter didático e ao mesmo tempo pessoal, ligando-se a algum personagem com funções de “narrador”, fundindo-se a um ambiente mais mundano, com opiniões diversas sobre a sociedade, a língua, a História do mundo e a cultura dos povos, partindo sempre da visão eurocentrista, algo que o cineasta nunca negou… e nem havia por quê.

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12º Lugar: O Velho do Restelo

2014

Última ficção dirigida por Manoel de Oliveira, aos 105 anos de idade, O Velho do Restelo é um interessante encerramento (nas ficções) para uma filmografia como a desse diretor. Na obra, Dom Quixote (que também aparece em clipes do longa russo dirigido por Grigoriy Kozintsev, em 1957) surge ao lado de Luís Vaz de Camões, Camilo Castelo Branco e Teixeira de Pascoaes, numa reunião literária e também filosófica sobre o passar dos anos, as conquistas e as derrotas da vida, o amor pelo ofício (qualquer ofício) e a noção de completude de uma missão e herança que se pode deixar para os descendentes (de sangue e ideias).

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11º Lugar: Francisca

1981

Não existem máscaras para as palavras. A segunda cena de Francisca mostra o protagonista, José Augusto (Diogo Dória), sem máscara em meio a um baile de fantasias, sorrisos e danças. Há quem diga que exista tristeza no olhar seco do personagem, fitando a câmera – ou a nós – sem um pingo de expressão. Se não o entristecimento – como verbaliza uma mulher posteriormente -, apenas vazio. Caso, em algum momento do longa-metragem, sinceramente exista sentimento no coração de Augusto, certamente estará desencontrado com as crenças daqueles que o cerceiam, principalmente sua amada raptada. Amada? O encerramento da tetralogia de amores frustrados, comandada por Manoel de Oliveira, expõe os sentimentos perdidos, aqueles que nem mesmo aparentam surgir, podem inexistir nas expressões das pessoas, nos melodramas das imagens, porém, se potencializam pela palavra e pela encenação. O cinema, o teatro e a literatura são um.

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10º Lugar: Singularidades de uma Rapariga Loura

2009

O trem de Macário e sua confidente aparece numa panorâmica e então os créditos finais surgem lentamente. Apesar do amor frustrado, a vida de ambos os protagonistas segue, mas os destinos ficam ocultos. Manoel de Oliveira faz um pequeno estudo sobre os costumes e as declarações de amor feitas a outrem sem propósito algum ou sob uma primeira impressão, sob um impulso. Longe de uma mensagem moralista, Singularidades de Uma Rapariga Loura incita-nos a pensar sobre qual é o motivo de nossas paixões arrasadoras e as possíveis consequências de insistirmos em alimentá-las.

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9º Lugar: O Gebo e a Sombra

2012

Há pouco silêncio em O Gebo e a Sombra, mas as muitas falas mais lamentam e desabafam do que criam conflitos e situações para serem resolvidas. Aliás, essa não é nem de perto a intenção do filme. Não há nada para resolver. Trata-se apenas de uma obra de contemplação; mas não aquela contemplação alienativa, de apenas ver e se entreter. O Gebo e a Sombra gera uma observação que beira o desespero, e por isso mesmo, faz com que o espectador pense sobre a profusão de pequenos temas abordados desde os diálogos iniciais, indo contra ou a favor de uma certa posição, sentindo de maneira quase física o peso de uma vida de mentiras, dúvidas e vergonha, terminando a obra com nuances de um Portugal (a despeito de ser falado em francês, uma parte do pequeno e excelente elenco é português e a alma do filme é lusitana) entregue a mentiras de toda uma vida em nome de um certo ideal ou dever.

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8º Lugar: O Meu Caso

1986

Experimental e inteligentíssimo, O Meu Caso (1986) é um filme de Manoel de Oliveira que apresenta um estudo cênico de palavra e imagem, de ideias e atos que se expandem a partir das três bases nas quais o diretor se inspirou para escrever o roteiro: a peça homônima de José Régio; o Pour en Finir et Autres Foirades de Samuel Beckett e O Livro de Jó, do Antigo Testamento. A exposição metalinguística — elemento que o diretor foi incorporando de maneira cada vez mais intensa em sua filmografia — está aqui em forma de um ciclo, onde o espetáculo da vida, da morte, das ideias e dos atos (em resumo, “os muitos casos“) se unem para falar da importância e nulidade dos acontecimentos da vida de alguém, vistos de fora.

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7º Lugar: Vale Abraão

1997

Vale Abraão (1997) é um épico sobre os valores tradicionais europeus, sobre as vicissitudes do amor e sobre um novo tipo de Madame Bovary, num estudo feminino e contemporâneo sobre o choque entre desejos, regras sociais e diferentes tipos de punição. Baseado no romance de Agustina Bessa-Luís, escrito e dirigido por Manoel de OliveiraVale Abraão se situa em um patamar complexo de conversas sobre valores ético-morais, sobre a passagem do tempo, sobre a configuração e destruição de laços e obrigações sociais e principalmente sobre a vida, em suas muitas faces, ideias e fases.

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6º Lugar: Benilde ou A Virgem Mãe

1974

O filme começa com a câmera atrás do set de filmagens, perambulando entre os corredores registrando todo o aparato técnico a ser usado durante a gravação. Durante os créditos iniciais, essa marcha assombrosa até o palco deve durar uns cinco minutos, até que é chegado até a casa onde será encenada a história. Essa invasão vindo de fora para dentro será replicada de forma contrária ao final do filme, um expurgo, uma expulsão. É um movimento que registra a persistência divina, que circunda o espaço nesta obra de Manoel de Oliveira, mas também registra a própria Benilde, que decide sair de casa ao engravidar antes de seu casamento.

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5º Lugar: Famalicão

1941

Filmado em 1940 mas lançado oficialmente em 27 de janeiro de 1941 (por isso as divergências de indicação do curta como sendo de um desses dois anos) Famalicão é, em muitos aspectos, uma continuação de Douro, Faina Fluvial, lançado dez anos antes, na estreia de Oliveira na direção. E eu digo isso levando em consideração a essência dos dois filmes: obras que se dispõem a mostrar o cotidiano da população numa determinada cidade e espaço de tempo. Ambos os curtas são crônicas de trabalho, de vivências e trajetos pela região, mas na forma de abordar as mesmas questões, o diretor segue um caminho diferente em cada uma das películas, mostrando o amadurecimento e refinamento de sua linguagem e maneira de guiar um filme.

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4º Lugar: Acto da Primavera

1963

Baseado em um texto do século XVI escrito por Francisco Vaz De Guimarães, Acto da Primavera(1963) foi filmado entre os anos de 1961 e 1962, junto ao povo da Vila de Curalha, Portugal, que tinha por tradição realizar, ano a no, o seu próprio Auto da Paixão. Os letreiros iniciais do filme não deixam dúvidas de que se trata de um trabalho de forte cunho teatral e, acima de tudo, popular, com papéis interpretados por não-atores (embora isso não seja realmente um diferencial, já que a teatralidade é uma marca proposital exigida por Manoel de Oliveira mesmo aos atores profissionais de seus filmes). Motivos medievais e secularismos vivem lado a lado aqui, como proposta do próprio diretor. E ele faz questão de realizar essa paixão dando a ideia de um ciclo da vida histórica e política da própria humanidade. Não é de se estranhar que tenha tido muitos problemas com a censura da ditadura salazarista por causa desse filme.

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3º Lugar: A Divina Comédia

1991

Em um cinema tão marcado pela reflexão sobre a condição humana e nosso eterno embate com o caos que nos governa, não é de se admirar que uma das maiores obras-primas do português Manoel de Oliveira seja tão recheadas de citações filosóficas, literárias e religiosas. Quando o renomado diretor lusitano lançou, em 1991, o seu belíssimo A Divina Comédia, enganou-se completamente quem imaginou que ele apenas (se é que o advérbio realmente caiba aqui) adaptaria a obra homônima de Dante Alighieri. No longa-metragem do português, não há Paraíso, Inferno e Purgatório, como na monumental obra do italiano. Manoel de Oliveira parece optar por seu título mais como uma pista falsa, a fim de surpreender seu público com uma obra mais ao sabor niilista, com forte tom dostoievskiano e nietzscheano. O que se vê na tela é um simples manicômio, gerenciado pelo próprio criador e no qual todos os alienados nada mais são do que tipos humanos por excelência. Essa divina farsa talvez seja ainda mais humana.

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2º Lugar: Amor de Perdição

1978

Primeiro filme de Manoel de Oliveira produzido e exibido após a Revolução do 25 de Abril, que encerrou o regime ditatorial do Estado Novo, Amor de Perdição foi recebido da pior forma possível em seu país recém democratizado. Um filme pomposo e elegante, tratando da burguesia novecentista, com aquela encenação pesada típica de Manoel de Oliveira, sua obra não foi bem vista diante do novo cenário audiovisual lusitano, que dedicava-se à expressões artísticas populares e entendíveis para qualquer espectador.

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1º Lugar: Aniki Bóbó

1942

Aniki Bóbó é um filme infantil, mas sobre crianças de verdade, não sobre filhotes-fantoches à laDisney, com problemas-padrão, dificuldades artificiais e resoluções fáceis, moralmente massacrantes e supra-direitistas. O roteiro dos contos fantásticos passa longe da obra de Oliveira. O que temos em Aniki Bóbó é uma crônica social; um pouco contida, é verdade, mas muito mais próxima de Os Esquecidos do que de Peter Pan.

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