Obs: Contém spoilers dos números anteriores, cujas críticas podem ser lidas aqui. Leia também as críticas de todo o Millerverso de Batman, bem aqui.
Não seria nem um pouco incongruente se eu simplesmente copiasse e colasse minha crítica do número anterior de A Raça Superior aqui. Afinal, os dois principais problemas que alvejam a série estão presentes mais uma vez aqui: os enormes atrasos entre cada edição e o conteúdo brando e desapontador a cada vez que o leitor, sedento, confere o que Frank Miller e Brian Azzarello escreveram.
O sétimo e, se nada mudar, antepenúltimo número da minissérie vem mais de dois meses depois do anterior e avança a história em meio metro, não mais do que isso. O sentimento que a história principal, de apenas 22 páginas, passa é de ler um epílogo da edição #6. Tudo passa tão rápido e sem nada acontecer – quase não há diálogos! – que a história poderia ter duas ou três páginas que alcançaria o mesmo efeito.
Batman, como vimos antes, foi transpassado pela visão de calor de Quart nos estertores da batalha por Gotham City. Mas, claro, matar o Morcego não é uma tarefa fácil e os autores não dão nem tempo para que a gravidade da situação ganhe peso e eles já encontram uma solução para o ocorrido enquanto Carrie Kelly e a Comissária Ellen Yindel ficam chorando pela perda do herói, algo que, confesso, não faz o menor sentido lógico (Onde está o corpo, Carrie? Você realmente vai acreditar na morte de Bruce Wayne só com base no capacete da armadura entregue por Ellen?). Com isso, vai pela janela qualquer mínimo peso dramático que essa linha narrativa poderia ter, especialmente porque a recuperação de Wayne, apesar de se dar em razão de algo profundamente enraizado na mitologia do herói, é tratada como corriqueira e em um estalar de dedos.
Reparem aqui o que Miller e Azzarello já fizeram só nesses sete números: fingiram que mataram Eléktron, fingiram que mataram o Superman, fingiram que mataram o Lanterna Verde e, agora, fingiram que mataram o Batman. Praticamente um herói por número com rigorosamente ZERO de efetividade ou de geração de tensão para os leitores. E pior: estamos no Millerverso de Batman, fora da cronologia oficial, onde literalmente tudo pode acontecer. E nada acontece. Possibilidades mil são metodicamente jogadas no ralo pela total e mais completa falta de ousadia de um outrora destemido Frank Miller, o homem que reinventou o Homem-Morcego e, mais do que isso, foi um dos pivôs da recriação da forma de se fazer quadrinhos a partir da segunda metade dos anos 80. Todos sabemos que ele está com a saúde debilitada, mas Azzarello era um nome confiável que, porém, se mostra tão frouxo quanto Miller em realmente fazer algo com significado maior do que “mais uma história do Batman”.
Afinal, o “selo” O Cavaleiro das Trevas, iniciado com a inigualável graphic novel de 1986, pede mais do que meramente outra HQ bacaninha do herói. Ame-a ou odeie-a, O Cavaleiro das Trevas 2 pelo menos trouxe controvérsia e sentimentos fortes opostos sobre seu conteúdo. A terceira minissérie, até agora, não merece muito mais do que o adjetivo “legalzinha”, assim no diminutivo mesmo, o que é um acinte para tudo o que foi estabelecido antes pelo próprio Miller.
Somos deixados com um vazio narrativo, com uma completa falta de desenvolvimento que, aqui, se resume em Quart querer o irmão de Lara para si por vingança ou por alguma outra razão ainda desconhecida. Essa é a desculpa, claro, para que a Mulher-Maravilha, que inexplicavelmente ficou fora da história até agora, finalmente se envolva no conflito. Mas faltam apenas mais duas edições e dificilmente o rumo poderá ser corrigido agora, ainda que uma leitura do conjunto, ao final, possa dar algum sopro de vida à essa minissérie morninha e insossa.
Pelo menos a história secundária – intitulada Strange Adventures – é minimamente mais interessante, lidando com a volta de Hal Jordan, que procura sua mão e, mais especificamente, o anel que está no dedo. Nada de novo realmente acontece, porém, além da introdução de dois irmãos alados, provavelmente filhos do Gavião Negro e Mulher-Gavião, que não ganham um pingo de desenvolvimento e provavelmente só foram usados para jogo de cena. No entanto, claro, já é possível imaginar como essa história acabará, não é mesmo?
A arte da edição principal, sob responsabilidade de Andy Kubert com finalização de Klaus Janson continua da mais alta qualidade, o que é um alívio para olhos cansados. A tentativa bem-sucedida de se emular o fluxo narrativo da obra original permanece, com as atualizações necessárias. Na história secundária, a arte é do próprio Miller, mas, aqui, ela se mostra a melhor até agora, sem que ele deforme demais os personagens ou os cenários ou exagere nas poses impossíveis. Ainda não é o Miller de outrora, mas ele já deixou seus traços antigos há muito tempo e decidiu trabalhar com caricaturas que muitos leitores simplesmente não aceitam.
A Raça Superior continua seu passo errático em direção à conclusão que promete ser furiosa e espremidíssma, além de ainda muito longe no horizonte. Se pelo menos a próxima edição tiver o dobro – talvez o triplo – de páginas e trouxer peso dramático, a espera valerá a pena. Mas, do jeito que a coisa vai, teremos mesmo só mais uma história “legalzinha” de Batman e sua turminha da pesada…
*A edição #8, de um total de nove anunciadas até agora, está prevista para ser lançada nos EUA apenas em 29 de março de 2017.
Batman – Cavaleiro das Trevas III: A Raça Superior #7 (DK III: The Master Race #7, EUA – 2016)
Roteiro: Frank Miller, Brian Azzarello (ambas as histórias)
Arte: Andy Kubert (história principal), Frank Miller (história secundária)
Arte-final: Klaus Janson (ambas as histórias)
Cores: Brad Anderson (história principal), Alex Sinclair (história secundária)
Letras: Clem Robins (ambas as histórias)
Editora nos EUA: DC Comics
Data original de lançamento: 28 de dezembro de 2016
Editora no Brasil: Panini Comics
Páginas: 51 (as duas histórias mais páginas extras com capas variantes e esboços)