Home Música Crítica | A Rede Social (Trilha Sonora Original)

Crítica | A Rede Social (Trilha Sonora Original)

por Lucas Nascimento
869 views

estrelas 5,0

Não importa o que aconteceria, David Fincher atingiria Trent Reznor como um cometa. Os dois já haviam tido uma breve experiência no segundo longa do diretor, Seven – Os Sete Crimes Capitais, quando o então líder do Nine Inch Nails compôs a arrepiante trilha usada nos créditos de abertura. Foram quase 20 anos para que a parceria enfim tomasse uma forma sólida, mas A Rede Social veio para que Fincher enfim definisse o estilo musical de seus trabalhos, e para que Reznor, juntamente com seu parceiro Atticus Ross, virasse o ramo de trilha sonora hollywoodiana de ponta cabeça.

Porque a música de Trent Reznor e Atticus Ross para a saga de criação do Facebook é algo radicalmente diferente. Em sua abordagem eletrônica, a dupla dispensou orquestras sinfônicas e abordagens mais tradicionais, visando capturar o abstrato e a atmosfera emocional do longa e de seus personagens. Reznor optou por utilizar predominantemente um instrumento conhecido como Swarmatron, que é na realidade uma espécie de sintetizador que garante um som eletrônico de natureza mais orgânica; já que a dupla procurava evitar o aspecto clean e artificial do que já havíamos ouvido em outras trilhas de mesma estética. O que ouvimos em cena, é quase como um zunido, um sopro onírico capaz de ser mixado em diferentes tonalidades.

O tema principal que também abre o filme e o álbum é batizado de Hand Covers Bruise (aliás, a criatividade da dupla para batizar suas faixas é digna de nota), cujo sons eletrônicos predominantes remetem bastante àquele de um computador antigo, quase lembrando o velho barulho feito pela internet discada. Aliado a este efeito, temos três notas de piano que muito sutilmente nos passam o drama de Mark Zuckerberg e o sentimento de isolação que permeará sua busca por aceitação. O swarmatron aqui também sugere uma tensão crescente, já dando indícios do caráter sombrio de seu protagonista.

Mesmo sendo o tema central, é curioso como Fincher apenas o usou em momentos-chave: os créditos de abertura que nos introduzem ao universo de Mark, uma de suas cenas de depoimento e o emotivo e nervoso discurso de Eduardo Saverin após se dar conta de sua traição. Essa abordagem é essencial para o tom do filme, já que o roteirista Aaron Sorkin afirmou que imaginava uma vibe John Hughes para a paisagem musical do longa, e a entrada de Fincher e sua dupla definitivamente aprimorou o trabalho brilhante de Sorkin.

O swarmatron é usado exaustivamente para gerar uma infinitude de diferentes temas aqui, a maioria centrados em Mark. In Motion, Intriguing Possibilities Painted Sun in Abstract são três exemplos que traduzem musicalmente o imenso talento do jovem com computadores e programação, sendo o primeiro uma batida mais energética e jovial para a sequência do hacking, o segundo, com ritmo mais lento, o processo de criação de seu Facebook, e o terceiro que traz uma divertida melodia que oscila entre as faixas de L e R, ilustrando de maneira eficiente a súbita ideia do status de relacionamento.

As reviravoltas mais dramáticas também ganham faixas muito mais sombrias, com a discussão acalorada por telefone entre Mark e Eduardo ganhado uma batida intensa com On We March e a frustrante descoberta de Dyvia Narendra e os Gêmeos Winklevoss de que sua ideia fora roubada com 3:14 Every Night, onde temos o swarmatron mais abafado e distorcido do álbum, definitivamente garantindo uma sensação de desconforto. A cena final entre Mark e Sean rende algo mais melancólico, onde The Gentle Hum of Anxiety entra como uma melodia quase fúnebre, remetendo a um órgão desafinado, ainda que tenhamos notas de piano mais expressivas ao longo da faixa; mas principalmente no ritmo hipnótico da conclusão.

E os fãs do NIN vão se surpreender com versões remixadas de duas faixas do álbum Ghosts: A Familiar Taste (35 Ghosts IV) e Magnetic (14 Ghosts II). A primeira é quase um rock eletrônico que se encaixa perfeitamente com a sequência do Facemash se alastrando pelos computadores de Harvard, sendo uma ironia do destino que a versão original de Ghosts já trouxesse o efeito sonoro constante de uma superfície de vidro sendo arranhada, o que de certa forma remete à caneta bastão que Eduardo usa para escrever a equação na janela do dormitório. A segunda também parece ter sido composta para o projeto, já que define com perfeição a postura radical do Sean Parker de Justin Timberlake, com a percussão eletrônica e os sons de metais, objetos afiados e até talheres fornecendo o tom certo para a cena do jantar.

A outra releitura do álbum é mais famosa, claro. Para a icônica cena da corrida da Henley Royal Regatta, Fincher optou por usar a imortal In the Hall of the Mountain King, de Edvard Grieg, mas pediu a Reznor e Ross que lhe dessem uma nova roupagem; algo eletrônico, que fizesse parte do pacote, claro. A inspiração veio do trabalho de Wendy Carlos, que ajudou a remixar eletronicamente diversas músicas para os filmes de Stanley Kubrick. O resultado é algo impressionante, e que – na linha do trabalho de Carlos – atinge um resultado similar àquele utilizado na trilha de Laranja Mecânica.

É uma trilha fantástica e original que mereceu cada grama de ouro de sua estatueta do Oscar, transformando-se em uma referência obrigatória para composição musical orgânica e, principalmente, eletrônica. Agora o gênio de David Fincher está completo com a dupla musical deTrent Reznor e Atticus Ross, e não seria a única vez…

The Social Network

Composto e conduzido por Trent Reznor & Atticus Ross
Gravadora:
 The Null Corporation
Estilo: Trilha Sonora
Ano: 2010

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais