Home LiteraturaConto Crítica | A Saga do Bruxo Geralt de Rívia – Vol. 2: A Espada do Destino, de Andrzej Sapkowski

Crítica | A Saga do Bruxo Geralt de Rívia – Vol. 2: A Espada do Destino, de Andrzej Sapkowski

por Lucas Borba
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Uma coisa é ser ousado. Outra é saber quando e como sê-lo. Com seu segundo livro para A Saga do Bruxo Geralt de Rívia, série que gerou a também tão maravilhosa série de games The Witcher e até mesmo uma ótima história em quadrinhos, Sapkowski mostra que não só é duplamente ousado, ao investir num segundo volume com narrativa episódica, mas também duplamente brilhante, preciso em sua habilidade para contar uma grande história. Sim, uma grande história, a começar por maravilhosas histórias menores.

Como no primeiro livro da série, O Último Desejo, o leitor é agraciado com mais seis contos acerca de aventuras do bruxo do título, que, com seus chamativos cabelos brancos, cavalga de vilarejo em vilarejo, de cidade em cidade em busca de emprego, das criaturas mais repugnantes, assustadoras ou simplesmente indesejáveis para, a mando de quem pague bem e segundo o interesse do próprio bruxo, exterminar. Não que, no universo distópico onde a saga se passa, as pessoas costumem agradecê-lo por isso, já que, em tal realidade, o homem não está fazendo mais do que sua obrigação, quando não é visto, aliás, como um ser tão indesejável quanto os que é incumbido de eliminar.

Sapkowski não tem a menor pressa em deixar isto claro, mas ainda no primeiro conto descobre-se, no caso de quem leu o livro anterior, que a narrativa se passa algum tempo depois daqueles eventos relevantes ao arco principal da saga. Claro, por relevante entenda-se, aqui, eventos de importância explícita para o presente volume e os seguintes, mas a verdade é que tudo, absolutamente tudo em A Espada do Destino, assim como em O Último Desejo, é absolutamente relevante para a construção e desenvolvimento do universo de Sapkowski e de seus personagens. Neste segundo volume, o leitor se aprofundará um pouco mais no passado e, principalmente, no íntimo de Geralt, este que, à primeira vista, parece insondável e realmente desprovido de uma consciência genuína.

Já no primeiro conto, quando o bruxo se vê unido a uma trupe em busca de um dragão que nem ele acredita existir, trupe na qual se inclui seu velho amigo matreiro e rei dos poetas, o impagável Jaskier, Geralt acaba por cruzar com Yennefer, a feiticeira que protagoniza, ao lado de Geralt, o grand finale do volume anterior, e que será responsável por reacender emoções do homem aparentemente adormecidas até então – reencontro preenchido com os diálogos provocativos e intensos característicos de Sapkowski. O segundo conto, por sua vez, cria uma sensação de continuidade em relação ao anterior, assumindo um tom entre o doce e o melancólico ao, astutamente, relatar um período de convivência rotineira do bruxo com a feiticeira, bem como, claro, as complicações, sob diferentes aspectos, que provêm de tal convívio, no que Sapkowski, sempre em ritmo preciso, cria um mosaico narrativo cada vez mais definido.

Tal precisão prossegue, inabalável, no terceiro conto, que, visando um equilíbrio, assume, em oposição a história anterior, um ar de todo aventuresco, divertido e bem humorado, quando Geralt e Jaskier se envolvem em uma confusão de troca de identidade armada por um ananico, um tipo de anão que, no universo de Sapkowski, pode imitar a aparência de outros. Já no quarto conto, volta a melancolia, com um misto de aventura, quando Geralt conhece uma poetisa por meio de Jaskier, personagem marcante o bastante para assumir seu posto como parte das figuras centrais da saga, mas que traz, no destino a ela reservado e relatado em uma única frase, de toda fria e sem qualquer resquício da intensidade que transborda pelo texto de Sapkowski ao longo de toda a narrativa, talvez a maior prova do poder que o escritor tem para mexer até com as emoções do leitor mais apático.

No conto seguinte, de modo tão inesperado e, por vezes, tão discreto quanto o destino, Sapkowski relata o encontro casual de Geralt, em certa floresta, com aquela menina que, sem o bruxo saber, assumirá importância primordial em sua vida e determinará todos os seus passos no restante da saga, e que se somará à lista de personagens facilmente inesquecíveis dos volumes seguintes. Nesse ponto, destaca-se, mais uma vez, certo aspecto do brilhantismo de Sapkowski em optar pelos dois volumes iniciais da saga compostos por contos, quando, tal como na vida, certas pessoas, figuras, por mais marcantes que possam ser ou não a cada indivíduo, ou têm uma pequena participação na história do livro de cada ser humano, para de repente partirem e talvez nunca mais se ter notícia delas – ainda que tenham deixado sua marca, cumprido seu papel -, ou assumirem uma posição permanente, central no cotidiano de alguém, por vezes, do modo mais inusitado que se possa imaginar.

Por fim, o último conto é a prova definitiva do poder do destino. Apesar do primeiro encontro de Geralt e Ciri ter sido inesperado para ambos, o segundo, contra todas as possibilidades, apesar de tanta adversidade, inevitavelmente acontece, com o relato de um encontro do bruxo com a rainha Calanthe estabelecendo a conexão mais importante com eventos do volume anterior.

Com isso, Sapkowski enfim encerra a fase episódica de sua saga e, a partir do volume seguinte, quando toda a narrativa converge quase que exclusivamente para um único arco, toda beleza do formato de outrora produz seu magnífico efeito. Apesar de tantas pequenas histórias terem sido contadas, o leitor passa a ter a certeza de que está apenas no começo, nem de longe pelo mero número de livros, de uma legítima grande história.

A Saga do Bruxo Geralt de Rívia – Vol. 2: A Espada do Destino (Miecz Przeznaczenia), Polônia – 2012
Autor: Andrzej Sapkowski
Editora no Brasil: WMF Martins Fontes
Tradução: Tomasz Barcinski
Páginas: 380

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